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A Propósito de Quase Tudo: opiniões, factos, política, sociedade, comunicação

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Um artigo de opinião por Maria joão Marques

25.06.25 | Manuel_AR

Nacionalidade, residência e sharia

Deve ser essencial, quer para a atribuição do título de residência, quer de nacionalidade, a recusa, por escrito, a recorrer a qualquer “tribunal” que não siga as leis portuguesas.

O Governo aprovou alterações à lei da nacionalidade, uma medida de elementar bom senso. Passa para dez anos o mínimo de residência legal para a generalidade dos imigrantes e para sete anos para os originários dos países de língua portuguesa. Não há números mágicos nestas leis, mas houve um objetivo declarado do PS de deixar entrar muita gente no país, porventura para angariar futuros votantes — já houve militantes do PS dizendo isso mesmo: que os imigrantes, depois de obterem nacionalidade, não se esquecerão do partido que os ajudou — e por ora há uma necessidade absoluta de fazer por integrar os que cá estão, de retirar os ilegais e de aos de mais tratar de lhes legalizar a permanência.

Mas não são só os números de anos a residir em Portugal que contam para atribuir a nacionalidade. Do que ficou fechado no Conselho de Ministros, pretende-se que os candidatos a atribuição da nacionalidade dominem a língua e a cultura portuguesas, que conheçam os mecanismos democráticos e declarem adesão à democracia. Tudo muito bem, mas não chega.

Não basta conhecer a cultura portuguesa. Para atribuir a nacionalidade tem de ser preciso estar integrado nela. Há uns tempos a esquerda nacional, no desligamento da realidade que a tem caracterizado, indignou-se muito por Pedro Nuno Santos (com todo o acerto) ter dito que os imigrantes devem respeitar a cultura portuguesa. Garantiram-nos que somente tinham de respeitar as leis portuguesas.

Bom, discordo, porque quando se vai à casa das outras pessoas aceitam-se as regras da casa das outras pessoas, mas mesmo pegando nesta veia minimalista de olhar para as obrigações dos imigrantes, pergunto: então se os imigrantes têm obrigação de respeitar as leis portuguesas, por que carga de água existe um tribunal da sharia na mesquita de Lisboa? (Este é conhecido; sabe-se lá quantos mais haverá nas pequenas mesquitas informais existentes nas zonas de grande densidade de imigrantes muçulmanos.)

Das duas uma: ou os imigrantes e os candidatos a nacionais portugueses respeitam as leis portuguesas e então não precisam de recorrer a tribunais da sharia; ou querem continuar a reger-se por esse maravilhoso quadro legal que em certas zonas do mundo leva ao apedrejamento de mulheres adúlteras e ao corte de mãos de ladrões (dos dois sexos) e então não têm qualquer vontade de seguir as leis portuguesas e, donde, não têm de ser cá recebidos.

Em qualquer dos casos, deve ser essencial, quer para a atribuição do título de residência, quer de nacionalidade, a recusa, por escrito, a recorrer a qualquer “​tribunal”​ que não siga as leis portuguesas. Repito: isto é necessário não só para a atribuição da nacionalidade como para a autorização de residência.

É certo que a comunicação social portuguesa gosta sempre de lavar com lixívia tudo o que se relaciona com o Islão. O PÚBLICO já escreveu um texto sobre o tribunal da sharia na mesquita de Lisboa, e quem lê até fica a pensar — isto se nunca tiver lido notícias sobre a condição feminina nos países islâmicos — que a sharia é inócua. Até se aceita benignamente as explicações sobre a poligamia — outra coisa que, sei lá, calhando, quiçá também não respeita as leis portuguesas mas é regulado na mesquita de Lisboa. O Expresso também já escreveu um texto apologista, no qual David Munir até diz, sem nenhuma contraposição factual, este estrondo: “Quando falamos da lei islâmica, sharia significa igualdade, transparência, fraternidade, respeito pelo próximo e pela sua crença, saber conviver com o outro, respeitar a mulher, ser honesto, justo. Isto é a sharia.”

Sim, é isso mesmo. Bravo para a clarividência dos media portugueses. O filho do presidente da comunidade islâmica, como qualquer muçulmano civilizado, chama à sharia barbaridade”. Já os nossos jornais, ao invés de denunciarem as atrocidades da sharia, tentam vender a coisa como benigna.

É extremamente grave e atentatório dos direitos das mulheres e crianças termos “tribunais” ilegais da sharia a decidir o que quer que seja em território nacional. Não precisamos chegar ao enorme “respeito pela mulher” que são as lapidações da sharia. A sharia também tem caminhos de “respeito pelo próximo” e pelas mulheres e pela “igualdade” que espoliam as mulheres nas heranças e que lhes diminuem os direitos parentais em caso de separação ou divórcio.

Os tribunais da sharia não são tribunais arbitrais, porque os tribunais arbitrais não podem decidir contra e à margem da lei portuguesa. E não aceito o argumento preguiçoso e mentiroso de que “são de adesão voluntária, é uma questão de liberdade”. Que graus de liberdade têm mulheres imigrantes, pobres, muitas vezes não falando a língua ou falando mal, sem nenhuma rede de apoio autóctone (digamos assim), para irem contra os preceitos sociais estabelecidos na sua comunidade, se estes preceituarem recorrer ao tribunal da sharia da mesquita mais próxima? Nenhuns.

De resto, a lei portuguesa está carregada de direitos inalienáveis de que os cidadãos portugueses não podem prescindir, mesmo se quiserem. Na lei laboral um trabalhador não pode acordar prescindir do direito a férias (pode, no máximo, encurtá-las uns tantos dias) ou, até, do horário para almoçar (que até tem duração mínima). E qualquer empregador que promova um acordo que retire direitos inalienáveis a um trabalhador leva uma multa pesada da ACT.

Ora, por que carga de água mulheres residentes em Portugal, ou já com nacionalidade, podem “livremente” (tosse) prescindir dos seus direitos parentais ou da sua parte da herança porque a sharia assim determina? E onde estão as multas pesadas para os “juízes” e os “tribunais” que decidem tais iniquidades? Ou, como se trata da vaca sagrada do Islão, tem de se aceitar tudo? E como as estropiadas são mulheres, também não interessa muito?

Há mais. Por falta de espaço, condenso. No Reino Unido, 22% das mulheres imigrantes não falam inglês, sobretudo vindas do Paquistão e Bangladesh. Temos, nós, país pobre, obrigação de receber famílias onde as mulheres ficam em casa, o que levará a rendimentos per capita baixos e aos intervalos do recebimento de prestações sociais?

A nacionalidade e a permissão de residência não são um direito dos cidadãos estrangeiros. Devem ser merecidas. E a mensagem aos imigrantes deve ser de exigência de respeito pelas nossas leis, economia e cultura. Não de rebaldaria.

A autora é colunista do PÚBLICO e escreve segundo o novo acordo ortográfico​