PSD: Acreditar ou não acreditar eis a questão
Na peça “Hamlet” de Shakespeare o personagem principal cita o seguinte verso:
Ser ou não ser, eis a questão: será mais nobre
Em nosso espírito sofrer pedras e flechas
Com que a Fortuna, enfurecida, nos alveja,
Ou insurgir-nos contra um mar de provocações
E em luta pôr-lhes fim?
A oposição de direita desempenha um papel cujo objetivo é apenas o de tentar desapear o Governo em funções para, através de eleições antecipadas ou no tempo limite, o substituir por um outro que julgam venha a ter melhor desempenho e capacidade governativa. Em democracia é assim, sem o que esta não faria sentido.
Numa democracia os governos são expostos a críticas pelos partidos que se encontram na oposição e pela avaliação da opinião pública, muitas vezes condicionada pelos media e as suas agendas mediáticas e políticas.
Na nossa democracia representativa é possibilitada a discussão entre vários pontos de vista ideológicos sobre o tipo de governo, o que, consequentemente, pressupõe argumentos e contra-argumentos das partes envolvidas no processo, partidos na oposição e governo.
A forma parlamentar de governo prevê o direito de cada indivíduo ou grupo ter uma opinião diferente. Assim, todos os pontos de vista deveriam ser expressos e discutidos pelos diversos representantes do povo escolhidos por eleições livres tendo como objetivo principal o interesse da vida dos portugueses. Isto é o que deveria ser. Mas nem sempre o é.
A oposição tem a responsabilidade de dar atenção e observar o desenvolvimento das políticas do Governo e discuti-las criticamente perante o parlamento e o povo propondo alternativas. Mas assim não procede.
O grande desafio para a oposição é a necessidade de poder ser vista como credível neste papel de crítico. Para obter essa credibilidade deveria ser responsável, respeitada e unida como partido político para propor políticas alternativas relevantes que se manifestassem para o dia-a-dia das pessoas. Mas nada disto faz a oposição.
Luís Montenegro, líder do PSD, é o principal rosto da oposição ao Governo liderado por António Costa. O líder do PSD tem criticado duramente as políticas do executivo socialista, acusando-o de falta de ambição, de irresponsabilidade orçamental e de submissão aos interesses dos partidos à sua esquerda. Esta último argumento perdeu a validade terminado o prazo da chamada “geringonça”.
As oposições de extrema-esquerda (a líder do Bloco prefere "esquerda radical") apenas podem ter como ambição a recuperação de alguns votos perdidos nas últimas eleições, o que penso ser insanável. A sua oposição baseia-se no ataque, em reivindicações sucessivas. Passado um mês da tomada de posse do Governo o BE já o acusava de ser “fraco” e de estar “em desagregação”. Comprometiam-se em combater a extrema-direita e a direita radical, mas prece que tal não está a acontecer. Reivindicam em sucessivos momentos grevistas com argumentos que mais parecem uma espécie de cassete dando margem à direita e à extrema-direita. Tal não é atípico porque no passado aconteceu que as extremas-esquerdas ajudaram a abrir as portas do poder à direita.
Como líder da oposição Luís Montenegro desvaloriza e omite das suas narrativas os pontos fortes dos resultados do Governo incidindo apenas nos pontos fracos ou falhas relacionadas com casos marginais do executivo em consonância com os media que os amplifica. O intuito é simples e propositado, mostrar que faz oposição. É oposição pela oposição. É dizer mal só para dizer mal como arma para desgaste do Governo PS.
Montenegro enfrenta agora outro desafio para além da sua oposição ao Governo PS que tem a ver com problemas internos no seu partido que começam a vir à superfície.
A perceção das pessoas é a dificuldade que a liderança do PSD mostra em não estar a conseguir afirmar-se como poder alternativo e credível ao atual Governo. Esta dificuldade surge num cenário político marcado pela polarização e pela crispação ajudados pelos partidos da extrema-esquerda, sobretudo o BE, e da extrema-direita, o Chega.
A evidência da alguma recuperação económica conseguida pelo Governo de António Costa está em contradição com as afirmações de Montenegro quando diz que o Governo PS está a conduzir o país para o declínio e que só uma mudança de rumo pode garantir um futuro melhor para os portugueses. Mas que rumo e que mudança?
Quando há números que mostram o bom desempenho do Governo em algumas áreas procuram-se argumentos e números retirados às estatísticas que são tratados para contradizer os bons resultados quando estes são evidentes. Isto faz-me recordar um livro de Nogueira Ramos “Torturem os Números que eles Confessam” onde denuncia o mau uso das estatísticas e da sua interpretação nociva. É uma forma perniciosa de servir objetivamente algum interesse ou uma visão facciosa da realidade social.
Na dita mudança de rumo que Montenegro propõe é que está a dúvida. Não basta dizer que é preciso uma mudança de rumo, complementarmente é necessário também definir qual será esse novo rumo, em que direção e em que sentido a oposição seguirá como alternativa. Quando a ponte de comando o comandante de um navio diz que vai proceder a uma mudança de rumo este deve especificar ao piloto as novas orientações, porque se tal não for indicado, aquele ficará desorientado por desconhecer o rumo e coloca em risco a embarcação.
Um eleitor que neste momento pretendesse votar no PSD em alternativa ao PS não sabe se o deverá fazer porque desconhece o que o seu substituto terá para lhe oferecer a não ser as críticas ocasionais que faz ao executivo em funções e ao seu líder.
A oposição voa continuamente na TAP porque não têm mais nada em concreto para fazer oposição. Mas a TAP, embora seja um assunto importante que se deve tratar e resolver, não põe pão na mesa dos portugueses como alguns dizem.
Luís Montenegro para ser coerente com as críticas que faz à atuação do Governo deveria ao mesmo tempo sugerir propostas que, segundo ele, responderia melhor aos mesmos problemas. Limita-se a retóricas críticas sobre o que faz o Governo PS e António Costa, debruçando-se sobre casos avulso, alguns com alguma importância, outros irrelevantes, para quem pretenda escolher nova governação num futuro mais ou menos próximo.
Faz-se oposição comentando-se factos marginais, pessoalizando-se políticas, relevando-se casos que não concorrem para a mudança das políticas que se criticam, porque não as há. O líder do PSD faz uma oposição pessoalizada e politicamente irrelevante sem propostas objetivas. Desta forma quem poderá confiar, acreditar, numa direita sem projeto alternativo credível?
Em dado momento era notória a ambiguidade que Luís Montenegro mostrou em relação ao não afastamento do partido Chega. Ultimamente talvez se tenha diluído um pouco devido à “nega” que lhe deu em relação ao projeto de resolução em que André Ventura, em modo oportunista e para ter visibilidade, recomendava a saída de João Galamba acusando-o de “imaturidade e de teatro político”. Claro que a rejeição de tal proposta por Luís Montenegro deu lugar a mais um “ataque” populista André Ventura ao responder que “o líder do PSD demonstra incapacidade de fazer oposição” e que “é por isso que nas sondagens 40% das pessoas dizem que é o Chega a liderar a oposição”.
O Chega de André Ventura, juntamente com a extrema-esquerda, têm sido fatores contributivos para a polarização crescente que é promovida por aqueles que se favorecem dela. Políticos, partidos e grupos mais extremistas alimentam-se do descontentamento e da intolerância para ganhar mais apoio para as suas ideias. Afinal, medidas extremas têm maior chance de aceitação quando se vê o outro grupo como um inimigo perigoso que é preciso eliminar, ao invés de um concorrente no debate.
Cada um segue o seu caminho, mas Luís Montenegro mostra que não está a conseguir capitalizar a oposição pela positiva. Contudo há quem queira o Chega e o PSD juntos, dizem para unir a direita, e outros que consideram esta ser uma união incompatível e improvável.
André Ventura não diz o que fará se ganhar eleições, embora o saibamos. Luís Montenegro também não diz o que fará, e como. O argumento para não dizer o que fará é uma espécie de tabu que se esconde ao dizer que não é ele, é o Governo que deve governar e não a oposição. Pela sua lógica o que o eleitor deve fazer é votar no escuro e acreditar no que Montenegro não diz.
A oposição feita por Luís Montenegro é um facto alternativo. É um facto que não existe, que não é convincente, é contraditório, resultante de manobras de diversão.
Se analisarmos as afirmações que Montenegro tem proferido elas são demonstrativas do balancé da sua oposição:
- Quando se candidatou à liderança do PSD afiançava estar mais preocupado em "dar respostas às necessidades das pessoas" do que em debates "ideológicos ou crises existenciais". Atualmente dedica-se a comentar e a fazer oposições através de crises existenciais.
- Ao mesmo tempo que diz estar pronto para governar, por outro não quer eleições antecipadas.
- Diz que “não pedimos eleições, mas também não as recusaremos”.
- Montenegro afirma que o PSD é a alternativa ao Governo e que está preparado para estar quatro anos na oposição, mas não diz o que fará se lá chegar. Se o disser só quando estiver no Governo, então ao pensarmos votar no PSD devemos ficar alerta.
- Faz comentários sobre o que se passa na comissão de inquérito à TAP em vez de se preocupar em propostas para "dar respostas às necessidades das pessoas". A comissão de inquérito à TAP passou a ser um local de intrigas e de assuntos pessoalizados e ainda existe na opinião pública porque interessa ao media.
- O PS garante que Luís Montenegro está a demonstrar “incapacidade em assumir-se como alternativa”. Pela oposição que tem feito até ao momento leva-nos a creditar que sim.
- Luís Montenegro preocupa-se em limpar do seu discurso os bons resultados da governação as respostas que têm sido dadas a vários problemas.
O que a democracia, nem ninguém precisa é que o PSD se volte para o populismo que vive de inverdades, de meias-verdades, de mentiras e de factos alternativos, ou verdades alternativas, como se queira. Assim vai ser difícil “Acreditar” que é o slogan do PSD.