Perigosos incendiários florestais
Saído do algarve viajo em direção ao norte. Acima da linha do rio Tejo os cheiros do mar substituem-se ao odor a esturro das florestas queimadas.
Os incêndios devastam serras, florestas, perigam povoações, casas, animais e pessoas que vivem nas redondezas por onde o fogo se propaga sem contemplações iniciado por mãos criminosa aliciadas por dinheiro fresco, ganho apenas com o trabalho de riscar um fósforo destruindo bens e vidas de quem se sustenta com trabalho duro.
Nesta época do ano, parca em acontecimentos políticos que não possibilitam a captação de audiências os órgãos de comunicação social televisivos não têm mãos a medir e as redações aproveitam este filão noticioso.
As notícias sobre a destruição de património florestal pelos incêndios substituem-se aos comentários especulativos e às notícias sobre política tendenciosamente desestabilizadoras.
Na época de incêndios, como se estes fossem uma época, como pomposamente os canais de televisão denominam os incêndios logo no início da primavera e do verão, na sua ânsia de informação, e de “serviço público como tão bem sabem fazer”, convidam toda a espécie de sumidades e personalidades entendidas sobre florestas, incêndios, ordenamentos, para entrevistas e debates sobre o tema. Todos os anos dizem o mesmo, especulam, peroram, defendem, atacam.
Ao longo de mais de trinta anos os incêndios passaram a ser a regra e não exceção. A partir de maio, assim que a meteorologia prevê aquecimento estão eles, os diligentes e atentos das redações dos canais de televisão antecipando notícia do que preveem irá ser notícia. Isto é, preveem aquilo que vai acontecer sem saberem se vai de facto acontecer. Há uma estranha sensação de que preparam, estimulam, aliciam para que aconteça, para que haja notícia.
No calor dos incêndios, as populações acodem, socorrem, apoiam quem acorreu em seu auxílio, os incansáveis bombeiros, quando podem. Os canais informativos primeiro, depois os generalistas, repetem até a exaustão notícias cada vez mais assustadoras e, para acalmar a raiva dos que por toda a parte clamam por justiça avançam com progressos efetuados pelas várias polícias na detenção de presumíveis incendiários. Falam em culpados, suspeitos, indiciados, fazem prisões preventivas, informam sobre números de suspeitos e que as polícias detiveram ou que se encontram em averiguação. Divulgam o perfil dos potenciais incendiários, inimputáveis, uns, outros são geralmente novos ou idosos, desempregados, alcoólicos oue toxicodependentes e, caso estranho, utilizam isqueiros ou fósforos para iniciar o incendio. Estranho seria que utilizassem lança-chamas!
Fazem-se petições para agravamento de penas para incendiários. Juízes sentenciam que os reincidentes pirómanos retornem à prisão durante a época estival. Mas não será isto apenas para acalmar a voz do povo que especula nas ruas, nos cafés, nos bairros que, sem compreender, atribui e aponta as mais diversas as causas para estes atos criminosos?
Na voz de alguns países, nossos parceiros da U.E., somos quase uma espécie de párias, não o dizem, mas de forma mais diplomática lá o vão dizendo de modo a ser politicamente correto. Agora somos um povo de perigosos de incendiários e, neste ponto, temos que lhes dar razão se nos chamarem PIF’s, povo de Perigosos de Incendiários Florestais. Custa-me dizê-lo mas a evidência confirma-o, diariamente, nas últimas três semanas.
Surgem notícias rebuscadas com imagens que mostram incêndios noutros países como em Espanha e em França. É como quem diz: veem não é só cá! E o povo reproduz. Funciona como uma espécie de purga para as consciências face aos desastres premeditadamente provocados por indivíduos ou grupos de incendiários. Não se queira comparar o que é incomparável. Uns, são casos pontuais, outros, os nossos, em Portugal, são sistemáticos, organizados e de cariz marcadamente criminoso. Especula-se sobre as causas que motivam estes atos criminosos que terminam quase sempre em culpados cujo perfil atrás referi.
Se pudéssemos ao longo dos últimos trinta anos, cartografar os dados de áreas ardidas, para um analisar e comparar as suas localizações, dias e horas do início das ignições e dos alertas, a importância económica e ecológica das áreas incendiadas, os locais de importância paisagística para o turismo, a proximidade de reservas naturais para uma análise temporal daquela informação cartografada provavelmente mostraria um padrão que indiciaria que não há aleatoriedade e ocasionalidade dos incêndios mas um planeamento prévio que pressupõe a existência de uma rede de terrorismo incendiário, cobarde e sem rosto, muito bem organizada com objetivos definidos a médio e longo prazo. A média e grande extensão dos incêndios incontroláveis, como o foram os deste verão, mostra exatidão nos locais, a utilização das previsões meteorológicas relevantes para a prática deste terrorismo, o conhecimento da impossibilidade da plena eficácia de meios no combate ao incêndio nas áreas escolhidas a que se junta a seleção de indivíduos que são facilmente aliciados com motivações que vão para além das aparências apontadas ou o maluquinho da aldeia ou o sujeito ou sujeita que resolveu fazer um fogacho para uma sardinhada e que não teve cuidado. Como ouvi dizer o presidente da Cáritas portuguesa, há forças ocultas que estarão por detrás disto.
Funcionam como máfias organizadas onde quem está no terreno desconhece quem é o mandatário do crime ou até a motivação para tal. Um desconhece o agente imediatamente anterior, Não é justificável qualquer que seja a motivação para que portugueses destruam o país onde vivem.
Na Europa temos a fama de sermos um povo que vive acima das suas possibilidades, gastador, acusação que é, como se sabe, falaciosa, agora de sermos considerados um povo perigosamente incendiário é que já não nos livramos.
Hoje é o dia em que o querido líder do PSD Passos Coelho vai dizer as balelas do costume no Pontal o que centrará as atenções dos órgãos de comunicação social que aproveitarão para o “puxar para cima”, e os incêndios passaram à história.