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O segundo lugar da ciência na corrido ao lucro e a política na vacina da Astrazeneca

18.03.21 | Manuel_AR

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Começa a haver um cansaço e falta de paciência para ouvir António Costa e alguns membros do Governo. Tenho a sensação de que andam às voltas perdendo-se em pormenores perdendo a capacidade de síntese, objetividade e assertividade face às decisões a tomar, o que me leva pela primeira vez a desconfiar de que o que dizem e fazem é sem convicção gerindo as intervenções numa atitude propagandística. A comunicação tardia ao arrasto de outros países sobre a suspensão da vacina da Astrazeneca foi paradigmático.  

Em 7 de fevereiro, a África do Sul suspendeu os planos para o lançamento de 1 milhão de doses da vacina AstraZeneca. Um pequeno ensaio não conseguiu demonstrar que protegia os sul-africanos contra uma nova variante que se tornou predominante no país. Enquanto isso, a AstraZeneca da Oxford disse que estava a trabalhar numa nova versão da vacina à medida para aquela variante.

A Dinamarca, Islândia e Noruega suspenderam o uso da vacina em 11 de março por causa de preocupações sobre um possível aumento do risco de coágulos sanguíneos. A Alemanha, França, Itália e vários outros países seguiram-se logo depois suspendendo a administração da vacina devido às preocupações sobre coágulos sanguíneos nas pessoas que tomaram a vacina, no meio do que o regulador médico da União Europeia insistiu que seus benefícios superavam o risco de efeitos colaterais. Contra corrente em 13 de março o Brasil aprovou totalmente a vacina.

Ouvir o nosso primeiro-ministro dizer que a dita vacina é segura mesmo para os maiores de 65 anos e que até ele já a tomou em nada me tranquiliza. Estou-me nas tintas para que ele tenha tomado aquela vacina ou outra qualquer, o que me interessa é que não se transforme a população numa espécie de cobaia em que meia dúzia de mortes são pequeno efeitos colaterais, caso as suspeitas de morte ou outras patologias se confirmem como resultado da dita vacina.  

Gostaria de perceber porque será que tantas vozes se elevam a defender a vacina Astrazeneca, tentando fazer comparações com as contraindicações de outros medicamentos desde há muitos testados e implantados no mercado. Buscam-se estatísticas de incidências que nada têm a ver com as duma vacina que nem meia dúzia de meses tem de administração. Note-se que a empresa AstraZeneca Portugal surgiu em abril de 1999, a partir da fusão da empresa sueca Astra AB com o Zeneca Group PLC do Reino Unido e está concentrada em três áreas terapêuticas: Cardiovascular, Renal e Metabólica, Doenças Respiratórias e Oncologia.

As vacinas normalmente exigem anos de pesquisa e testes antes de chegar à fase clínica, mas em 2020 os cientistas entraram numa corrida para produzir vacinas contra o coronavírus seguras e eficazes em tempo recorde. Em 8 de dezembro, pesquisadores da Universidade de Oxford e da empresa sueco-britânica AstraZeneca publicaram o primeiro artigo científico sobre um ensaio clínico de Fase 3 de uma vacina contra o coronavírus. O ensaio demonstrou que a vacina pode proteger as pessoas da Covid-19, mas deixou muitas questões sem solução sobre os resultados, inclusivamente na administração a maiores de 65 anos. Passadas semanas já não haveria problema e dizem ter havido evidências (!!?) de que não havia contraindicações.

Apareceram algumas vozes nas televisões a “esclarecer”, em abono da vacina da Astrazeneca, alegando que todos os medicamentos têm contraindicações e apontam que, no caso desta vacina, os casos são muito raros em função das administrações efetuadas. A OMS faz coro com essas vozes. A DGS diz que não há problema, mas para os que a tomaram estarem atentos e em casos anómalos para consular um médico. Outros ainda gritam por meias palavras que não importam meia dúzia de vidas que sejam vítimas em comparação com os benefícios que pode trazer, como se fosse esta a única vacina que apareceu no mundo. Há mais do que a da Astrazeneca! Porquê a insistência nesta da Astrazeneca/Oxford?

Neste contexto fica-se com perplexidade ao ler o editorial de Manuel Carvalho no Público quando se refere às “escassas mortes que ecoaram na imprensa” criticando a atitude dos vários países que resolveram parar com a vacina da Astrazeneca até esclarecimento cabal dos casos que vieram a público, presumivelmente causados por aquela vacina. E continua: “Mesmo sabendo que a suspensão das vacinas pode revelar um saudável desejo de proteger algumas pessoas, os governos puseram de lado essa questão magna da política democrática que tem que ver com o interesse geral. Numa linguagem gélida, que a vida tantas vezes exige, concentraram-se nas escassas mortes que ecoaram na imprensa e esqueceram centenas de vidas que a vacina poderia salvar nas próximas semanas.”, e acrescenta Manuel Carvalho “Ao parar por reflexo um processo crucial para o futuro próximo, a vacinação, com base em suspeitas não comprovadas nem reconhecidas pela ciência, a Europa mostrou a flacidez do costume sempre que é preciso coragem, confiança e determinação. A menos que a ciência conteste o que sabemos hoje, não agiu para o seu bem, nem a favor da vacinação”.  Mas o que deu a esta gente? Alguém me explica?

Não se percebe então a preocupação das autoridades de saúde e do Governo em relação ao número de caso e de mortes causados pela covid-19 tomando em conta os valores atingidos. Se não, vejamos: em Portugal, segundo fonte da Johns Hopkins University e até 14 de março, o número de casos por milhão de habitantes era de 53,6 o que corresponde a 0,00530 por 100 habitantes. O número de mortes foi de 1,47 por milhão de habitantes o que corresponde a 0,000147 por 100 habitantes. Ora estes valores verificados na população em relação à covid-19 ainda estão abaixo daqueles que alguns cientistas referem sobre a baixa probabilidade de contraindicações da vacina poderem acontecer. Porquê então preocupação em relação aos números da pandemia? (Ironia). Se por um lado é devido à difusão do contágio, por outro, se se morrer devido a contraindicações da vacina já não há problema, são efeitos colaterais. Deve ser este o ponto de vista dos responsáveis.  

O regulador de medicamentos da UE disse que permanece “firmemente convencido” de que os benefícios da vacina Oxford / AstraZeneca Covid superam os riscos, mas os casos isolados de coágulos sanguíneos “são uma preocupação séria e precisam de avaliação científica séria e detalhada”. Emer Cook sugeriu em 16 de março que era possível que os riscos fossem maiores para algumas categorias de pacientes. “O que estamos entendendo é que eles podem estar associados a algumas subpopulações”. Contudo alguns especialistas também disseram que casos raros de trombose cerebral ser altamente incomum em pessoas mais jovens podem indicar uma relação causal com a injeção.

A corrida pela procura de uma vacina contra a covid-19 transformou-se numa competição para ver quem chegava primeiro ao potencial mercado que se previa ser muito lucrativo. Encontramo-nos numa economia capitalista e o meio científico e empresarial no mundo das farmacêuticas têm todo o “gosto” em entrar nesta competição. A maioria dos cientistas e investidores nos países desenvolvidos não se importa com o que está a trabalhar desde que em tal haja a possibilidade de se fazerem novas descobertas para aumentar os lucros através de um mercado promissor e lucrativo.

A estes acrescenta-se também a da competição política pelo desenvolvimento e distribuição da vacina.  A vacina da Astrazeneca foi desenvolvida em laboratório pela Oxford University do Reino Unido. A rapidez com que aquela vacina foi produzida e testada e aplicada no U.K. levam-me a encarar outro ponto de vista: será que não estará Boris Johnson a pretender provar à U.E. que passa bem sem ela após o Brexit e daí a corrida para cortar a meta da produção e vacinação da maior parte da sua população, ao mesmo tempo que pode colocá-la no mercado numa espécie de louca corrida para provar que o barco dele navega muito melhor do que os dos seus competidores mais diretos?