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A Propósito de Quase Tudo: opiniões, factos, política, sociedade, comunicação

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Nós, eleitores e crentes

03.06.23 | Manuel_AR

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Nós, os eleitores e crentes que temos direito de eleger, somos os cordeiros e o “pau para toda a obra”, nas mãos de obreiros da partidarite e de influencres mais ou menos hábeis, que grassam pelo país cujo objetivo último é atrair o maior número possível de crentes e de votos, o que, na gíria popular, se designa por caça ao voto e à compra. Para este tipo de caça vale tudo o que estiver disponível para persuadir, influenciar e condicionar os eleitores de modo astucioso.

Não é só na política, mas também noutros sentidos, que a caça e a crença se desenrolam, é também no domínio dos “shows” e rituais como os das seitas evangélica ou pró-evangélicas cada uma com os seus séquitos.

A decisão dos eleitores em votarem numa ou noutra força partidária é idêntico ao processo que leva as pessoas a acreditar que mudarão de vida por causa de uma qualquer X-talks (talk-lérias) ou, ainda, pantomimices de palestras de autoajuda e motivação ao vivo assim como as pessoas são levadas a acreditar que um ou outro partido irá resolver os seus problemas ou que um certo líder é que diz as verdades, não obstante ser apanhado a mentir quase diariamente. A sensação para quem está de fora é parecida: uma profunda incredulidade com o que se passa na cabeça dos eleitores que se transformam em crentes irracionais. O oportunismo de imagens religiosas nos fatos e capas que veste são usadas como chamariz são a evidência do apelo à crendice que acarreta.

Introduzo aqui uma analogia entre política e shows pagos para ouvir uma senhora que enriquece à custa da papalvice de alguns que a idolatram e acham que lhes vai melhorar a sua vida com as suas patranhices. Este tipo de palestras descredibilizam o ato político de escolhas porque tornam implícito que a crença neste tipo de negócio para melhorar a vida das pessoas passa por abandonar a escolha política.

Mais grave ainda é haver políticos que já foram aos programas daquela que parece querer identificar-se com uma qualquer “nossa senhora” como o fez o Senhor Presidente   Marcelo Rebelo de Sousa que chegou a telefonar-lhe na estreia de um novo formato (janeiro/2023) quando essa “Nossa Senhora” estava em direto. Este tipo de intervenções de políticos ajuda ao marketing do produto que uma qualquer “guru” com uma capa com a imagem de “Nossa Senhora” pretende vender. Este tipo de intervenções funciona como uma legitimação das qualidades que a apresentadora anuncia ter, assim como a dos produtos que vende.

Os políticos, e muito menos o mais alto dignitário de Portugal, não podem fazer de figurantes publicitários que contribuam para a credibilização de vendas personalizada duma pessoa que anuncia milagres, vende sonhos e ficções perigosas aos clientes que até podem ser perigosos para a própria democracia. Isto reveste-se de gravidade. É pura e simplesmente a negação da política quando se acredita que, o que aquele, ou aquela, pensa contribui para melhores condições de vida e está disposto a lutar por elas individual e coletivamente fazendo-os acreditarem que tudo conseguem.

Nós, os eleitores, somos frágeis e crentes e, por isso, estamos sujeitos a deixarmo-nos enganar por manhas. De acordo com a Bíblia, a serpente ludibriou Eva para enganar Adão e o conduzir à desgraça da perda do paraíso e, daí, o sofrimento ao Mundo. A desculpa de Eva foi simples “foi a serpente que me enganou e eu comi”. Esta resumida passagem da Bíblia serve para mostrar como é a estratégia dos partidos políticos para atrair o voto dos cidadãos. É assim o jogo em democracia. Procuram ganhar eleições fazendo promessas em que os eleitores apostam como se fosse um jogo do poker igual aos que vendem patranhas.

Os eleitores são sujeitos a esta espécie de jogo de caça ao “tesouro do poder” pelo voto. Os bons rapazes são eles, os dos partidos, e nós, os “gajos merdosos”, que nos deixamos enganar.

Nós, os eleitores, somos por natureza volúveis nas nossas opções, ora votamos num partido, ora votamos noutro. Os eleitores pensam que ao mudarem a opção de voto lhes trará vantagens, facto de que os populistas sabem tirar vantagens. Assim, nós os eleitores, devemos estar acima do ruído onde se perde o sentido do que interessa, mas naquilo que tenha impacto na sua vida.

Em todo o mundo partidos e políticos populistas têm mostrado capacidade para usar um discurso forte para atrair adeptos e votos. Quem escreve roteiros para filmes ou gosta de avaliar filmes tem uma regra que é o “KISS” - Keep It Short And Simple, isto é, mantenha a narrativa curta e simples. Esta é uma espécie de fórmula utilizada para quando se está a contar uma história, seja ela verbal, visual ou multimédia para que seja percebida por todos e essa também é a estratégia utilizada pelo populismo. Veja-se, por exemplo, as mensagens colocadas em outdoors dos partidos.

Para seduzir eleitores, partidos da extrema-direita e também da extrema-esquerda, recorrem ao discurso populista que parece estar a resultar, não apenas em Portugal. Face a isto, os partidos políticos democráticos moderados de direita e de esquerda deixam-se contaminar e passam muitas vezes a seguir o mesmo processo de comunicação com os eleitores.  Para fazerem oposição ao Governo, (qualquer governo), criam no povo a crença errónea de que o país está sob ameaça devido à má governação e corrupção causados por forças que o estão a destruir. Quem esteja na oposição e a concorrer ao poder, aponta ao alvo que, por princípio, é sempre o partido no governo, socialista ou outro qualquer.  O argumento é que o "verdadeiro povo" precisa de ser protegido dos corruptos e da falsidade. Como anseiam o poder recorrem à injuria, à ofensa, censuram e criticam o que está mal e o que está bem, tudo no mesmo saco. Podem ser os partidos políticos, a U.E. os imigrantes, etnias, salários, pensões, etc., estratégia usada sobretudo pelos partidos da extrema-direita.

Nós, os eleitores, devemos ter esperança, dizem-nos alguns. Esperança era uma das palavras preferidas usada pelo PSD na altura da troica (Passos Coelho). Esperança foi recuperada por Luís Montenegro que, motivado por Cavaco Silva, diz que, se o partido for apoiado e chegar ao governo, dará uma nova vida aos portugueses. O líder do PSD acompanha o Professor Aníbal Cavaco Silva no “sinal de esperança para os portugueses.”. Falta clarificar a esperança em quê. Numa nova vida baseada em quê?

A propaganda do PSD avança com um fraseado próximo do populismo: “Quem é o português que não está zangado neste momento, lá em casa, quando vê o dinheiro do PRR a não chegar aos negócios e às famílias, quando vê o caos nas urgências, quando vê greves de professores umas atrás das outras?”, palavras de Cavaco. Fazer chegar o dinheiro do PPR às famílias?!! Não basta dizer ou escrever à toa. Nós, o povo, os eleitores, os crentes em alguma coisa precisamos de saber o quê e como fará o PSD para alterar o que hoje critica. Nós, o povo, os eleitores, os crentes precisamos de conhecer claramente o projeto da direita para o país. Assim o diz Francisco Mendes da Silva (CDS).

O que os portugueses precisam de ouvir é, sobretudo, como é que um governo PSD resolveria para fazer chegar dinheiro às famílias, resolver o problema do “caos” nas urgências, dar resposta às exigências dos professores e à situação da falta de médicos de família.

Veja-se como o discurso de Cavaco Silva se aproxima do populismo que é a estratégia que Luís Montenegro passou a seguir. A ideia é criar algo que todos entendam, fáceis e compreensíveis como os movimentos populistas têm utilizado eficazmente nos últimos tempos. Os “heróis”(!) combatentes patriotas populistas lançam para o “ar” a ideia de que estamos numa desgraça da política e, por isso, lutam por uma espécie de ressurreição dizendo lutar contra uma crise social por eles construída artificialmente ajudados pelos media.

Nas representações típicas dos populistas verificamos que está sempre presente uma evocação de crise ou de declínio das instituições. É um dos elementos básicos das estruturas da sua argumentação, para além do discurso falsamente moralizado e centrado em suspeições e factos hipotéticos. A aproximação à pessoa comum e aos seus problemas individuais é um ardil. Outro ainda é a passagem da noção de pessoas comuns versus os políticos que são uma elite e que o povo tem uma espécie de senso comum implícito nos seus julgamentos. Desenvolvem teorias da conspiração acerca de intrigas malignas sobre os que os criticam e desenvolvem um discurso muito moralizado. Tentam instigar os instintos mais primários das pessoas criando tensões e quebrando as normas e valores, que caracterizam a coesão social.

Os eleitores, o povo em geral, não está ciente de que não está plenamente informado do que se passa no interior dos partidos nem nos corredores da política do país a não ser pelos media. Como os eleitores só recebem fragmentos episódicos de factos, frases bombásticas dos líderes dos partidos, notícias dadas pelos media, as quais não possibilitam conhecer as causas primárias, os potenciais eleitores são confrontados grosseiramente com notícias que lhes impingem por vezes aceitando-as acriticamente.

Os momentos das várias agendas mediáticas e políticas são focados na economia que não chega aos bolsos das pessoas, na crise da habitação que não é resolvida e a que os jovens não tem acesso, na corrupção que grassa, na pessoalização de casos, etc. É isto que diariamente é repetidamente metralhado e chega pela comunicação social aos potenciais eleitores que não sabe o que, entretanto, possa ter sido melhorado e implementado de novo, e, quando o é, é “En Passant”, de forma a passar despercebido.

Os comentários são repetidamente os mesmos: o que se passa com a política e com os políticos, o país não avança, está atrasado, os salários estão baixos, etc. Quem é o culpado? Claro, são os que governam no momento, o socialismo, e, para alguns, o primeiro-ministro, e, em alguns casos, a própria democracia. Os que assim falam julgam-se os representantes executivos, diretos e únicos, da verdadeira vontade do povo. Fingem defendê-lo contra os políticos que veem como sendo todos corruptos e parasitas, exceto eles próprios, claro!

Alguns da direita extrema fazem-nos acreditar que são enviados e apoiados por Deus para defender as pessoas contra as coisas más presentes nos tempos modernos. Daí a necessidade de mostrarem publicamente a sua religiosidade e como são seguidores fiéis da Igreja Católica os órgãos de comunicação, mais ou menos simpatizantes da causa, fazem tornar públicos.

Se estivermos atentos ao que os media nos colocam à disposição diariamente sentimos que o essencial dos factos não é relevante, não é essencial para as pessoas. O irrelevante dos factos é selecionado e amplificado para que sejam acionadas as críticas que sejam mais compreensíveis pelos potenciais eleitores e se indignem com a situação. Não interessa mostrar o enquadramento da causa que, por vezes, é mais complexa do que nos mostram.

As redes sociais possibilitam a qualquer um fazer comentários sobre a situação política que se tornou, por isso, uma maneira eficaz de promover narrativas oposicionistas de cariz populista assim como a publicação de notícias falsas. Há pessoas e grupos que se organizam de modo a tentarem influenciar a opinião pública sobre temas que lhes interessa. Coloca-se material como sendo notícia acerca de factos que são falsos e que, sem filtro, são assumidos como verdadeiros.

Os eleitores que almejam paraísos fictícios são ludibriados com vãs esperanças de promessas fortuitas vindas de alguns partidos que enchem a sua alma desejosa de melhorias intangíveis.

Os canais televisivos debitam diariamente no noticiários e debates políticos onde, por vezes, é evidente a falta de clareza, a repetição diária e sistemática das mesmas imagens e notícias sobre o mesmo tema transmitidos até à exaustão. A estes acrescem comentários e opiniões que fazem parte da agenda político noticiosa de cada canal construídos para causar nas audiências desorientação e funcionam como uma espécie de lavagem cerebral política induzida pelos media mais consumidos através dos quais os potenciais eleitores absorvem informação.

Saber distinguir o trigo do joio em tudo aquilo que os media e os partidos nos “vendem” é uma arte que deve ser cultivada, sem emoções arrebatadas levantadas pelos contextos políticos e até por opções pessoais de ordem partidária ou ideológica. Nós, os eleitores, não nos podemos deixar levar por crenças misturadas neste caldeirão emocional em que os media e os partidos nos fazem viver sem discernir racionalmente, o que, por vezes, se torna difícil.

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