Medo a arma do populismo
Lembram-se da frase de Passos Coelho quando, em 2016, ao despedir-se dos deputados do PSD, dramatizava em tom catastrofista a situação política com “Vem aí o diabo”? Disse ele então “Gozem bem as férias que em setembro vem aí o diabo”.
Passos Coelho para ajudar (ou prejudicar) o PSD/AD veio agora usar a mesma estratégia do recurso ao medo, desta vez o mais básico que é o medo do outro ao fazer a associação dos imigrantes com insegurança. Esta estratégia já é conhecida e praticada há muito por partidos populistas da extrema-direita.
Recordam-se quando em 2013 Pedro Passos Coelho, que estava há pouco tempo no Governo e na Suíça se restringia a entrada de imigrantes a todos os países da União Europeia aplicando um teto máximo às quotas de autorizações de residência e o então presidente do PSD Passos foi um dos chefes de governo europeus que criticaram tal medida?
Em 19 e 20 de dezembro daquele ano Passos Coelho discursava sobre as políticas de imigração europeias, que iriam ser tratadas pelos chefes do Governo no encontro de Bruxelas dizia então que “…é de lamentar que ciclicamente apareçam visões negativas de uma espécie de Europa fortaleza”. E mais, “A Europa precisa de imigrantes e força de trabalho”, embora possa “não ter condições para dar asilo a muita gente”, mas “precisa no seu espaço de acolher imigração porque precisa de contrariar os fenómenos de natalidade decrescente”. Mudou agora de opinião. Passos Coelho quer que a AD aproveite a “mãozinha” do Chega de Ventura.
Se recuarmos aos anos 30 do século XX verificamos que parece haver uma aproximação destas afirmações com partidos populistas e fascistas que recorriam ao medo para mobilizar as populações para os seus desígnios.
Sabemos como os partidos populistas de direita constroem com sucesso o medo recorrendo a perigos reais ou imaginários designando bodes expiatórios acusando-os de ameaçarem ou realmente prejudicarem as suas sociedades.
Todos os partidos populistas de direita instrumentalizam as populações contra algum tipo de minoria étnica/religiosa/linguística/política para serem os bodes expiatórios de todos os problemas atuais para, logo de seguida, acusarem o respetivo grupo como perigoso e como uma ameaça para nós e para a nossa nação, é o fenómeno que se manifesta pela política do medo.
Veja-se o caso do partido nazi na Alemanha de 1939 em que os judeus foram o alvo de perseguições pela mobilização da população contra eles, mas há outros. O fascismo, ideologia política autoritária e nacionalista, muitas vezes capitaliza o medo e o preconceito para ganhar o poder. Os líderes fascistas exploram as ansiedades da sociedade prometendo segurança, estabilidade e o acesso a uma era de ouro e de crescimento. Para capitalizarem preconceitos existentes, exploram os medos enraizados da população através de narrativas simplistas contra certos grupos como fonte de problemas sociais e pessoais que populações pouco avisadas percecionam.
Exemplos históricos como o regime nazi da Alemanha e o governo fascista de Benito Mussolini na Itália fornecem ilustrações claras de como o medo pode ser aproveitado para alimentar ideologias fascistas. No primeiro caso explorou-se a instabilidade económica, o sentimento antissemita para chegar ao poder. Ao criar-se um inimigo comum na imigração joga-se com os medos existentes que são usados para consolidar o apoio e controlar as populações.
Passos Coelho parece ter recorrido a um medo latente e perigoso para intencionalmente se aproximar do Chega e talvez captar alguns eleitores para a AD.
Os que promotores deste tipo de discursos populistas lançam para a população vários medos, como o de perder o emprego, medo de estranhos (ou seja, imigrantes), medo de perder a autonomia nacional, medo de perder as velhas tradições e valores, medo das mudanças climáticas, deceção e a repulsa de e para com a política tradicional e os políticos, da corrupção, a aversão para com o fosso crescente entre ricos e pobres, a pobreza devido a governos que pretendem derrubar, culpabilizam os que defendem o Estado Social, fomentam o descontentamento devido à falta de transparência na tomada de decisões políticas e assim por diante.
A intervenção de Passos Coelho foi perigosa e tinha a capacidade para abrir uma Caixa de Pandora”. O PSD só foi radical quando seguiu a política neoliberal de Passos Coelho. Embora digam que era necessário, mas o “ir para além da troika” não foi esquecido e a forma como ele se tem referido ao partido de Ventura também não. Passos Coelho teve com a sua intervenção na campanha da Aliança Democrática o acordo de André Ventura.
Em dezembro de 2023 questionado sobre se o PSD precisava do Chega para ter força para governar, Passos Coelho respondeu que um acordo entre os sociais-democratas e o partido de André Ventura depende das “estratégias partidárias e dos votos dos portugueses”, mas nunca excluiu a possibilidade desse acordo.
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