Fugir das armadilhas
Começo por lhes contar uma estória sobre ciladas. Imagine-se numa feira em que um sujeito, com uma abordagem assertiva e aparentemente simpática, o aborda e lhe mostra uma mercadoria que tira dentro duma malinha e lhe propõe a sua compra. É uma embalagem de perfume muito apelativa.
Inesperadamente você recua e diz que não quer. Mas o vendedor insiste consigo. Face a tal insistência pensa: «Já agora vou ver qual o preço que ele pretende». Neste momento parou para o ouvir e verifica que está perante a apologia e a propaganda do produto.
O vendedor propagandista, com o intuito de vender o artigo, diz ser um produto autêntico e verdadeiro. Para manter a credibilidade tira da malinha uma embalagem exatamente igual que já se encontrava aberta, desenrosca a tampa e pede-lhe para cheirar a fragância para que você confirme a originalidade do produto. Hesita, mas acaba por lhe perguntar qual o preço. Entretanto surge alguém que o avisa desmente quem lhe está a vender o produto. O vendedor do dito perfume interfere e interrompe para não deixa falar quem o estava a alertar. Procura contrariar o empecilho que lhe está a estragar o negócio usando uma linguagem contínua, grosseira, arruaceira, ofensiva e desordeira de modo que não se perceba o que o outro lhe diz. Fala ao mesmo tempo sem deixar que o outro argumente contra o seu produto. Este passo do vendedor arruaceiro quer mostra-lhe, a si comprador, que, afinal, ele é que sabe do produto que está a vender.
- O produto dele é falso, ele quer é destruir o produto que lhe está a querer vender. O produto dele é que, afinal, deve ser falso.
Você acaba por comprar o frasco da fragância ao primeiro vendedor, pagando por ele um preço muito mais barato do que inicialmente lhe tinha sido pedido e até mais barato do que o do outro vendedor concorrente.
Você chega a casa todo entusiasmado, conta à sua mulher e aos filhos, supondo que tem mais do que um, a excelente compra que fez do perfume com uma belíssima fragância. A família não abriu logo a embalagem reservou isso para mais tarde porque já era hora do jantar.
Após a refeição resolveram abrir a embalagem para se deliciarem com o odor da pechincha que tinha comprado. A embalagem foi aberta com toda a precaução para que nem uma pinga do precioso líquido se perdesse. Aberta a embalagem, tirado o frasco com um design impecável e desenroscada a tampa não foi necessário levarem a bocadura do frasco às narinas, dele saltou um cheiro nauseabundo a água estagnada.
Amanhã vais imediatamente à feira procurar do sujeito que te vendeu isto e te embarrilou - disse a sua mulher.
Na manhã seguinte dirigiu-se ao mesmo local, todos os vendedores lá se encontravam. Mas o que lhe vendeu a “fragância” nem o ver. Perguntou por ali e disseram-lhe:
- Ah! Esse? Ele costuma aparecer de quatro em quatro anos. Mas agora não sei! Como ele fez muitas vendas talvez apareça por aí um dia destes. Mas olhe que agora não vai ser fácil apanhá-lo, muitos já aqui vieram pelo mesmo motivo.
- Mas não sabe ao menos o nome dele? -perguntou você. Resposta em uníssono da gente que, entretanto, se juntou ao protesto.
- Sim. Sabemos. Dá pelo nome de Aventura.
Você foi para casa acabrunhado.
A estória não fica por aqui. Enquanto isto se passava e você já regressava a casa entristecido porque tinha sido levado pelo conto do vigário surgiu um novo indivíduo, desta vez com telemóveis da última gama - dizia ele. Oferecia dois pelo preço de um. Tinham chegado hoje, ainda nem tinha aberto a caixa.
- Podemos ver? Perguntaram alguns que se tinha aproximado plenos de curiosidade.
- Ainda não. Posso é dizer-lhes as características. São da última gama. Se comprarem um dou-lhes outro de oferta.
- Mas podemos ver o telemóvel – insistiu um dos mais afoitos – desejoso por saber o conteúdo da caixa.
O dito vendedor pega numa das caixas que trazia num outro saco, abriu-a e mostro o telemóvel. O potencial cliente, pegou no telemóvel, mirou-o com muita atenção e disse ao vendedor:
- OK, vale a pena, fico com ele – disse o freguês.
O vendedor naquele momento tirou-lhe o telemóvel da mão e entregou outro numa caixa por abrir ao mesmo tempo que informava o cliente de que o que tinha na mão era apenas para desmonstração, mas o que estava na caixa era exatamente igual. O cliente para pagou-lhe o valor pedido pelo telemóvel e o vendedor entregou-lhe outro grátis conforme tinha prometido. Após a transação o vendedor afastou-se de imediato do local.
O cliente seguiu o seu caminho ao mesmo tempo que ia tirando da caixa um dos telemóveis da última gama que tinha tido a sorte de comprar pelo preço da uva mijona. Abriu uma das caixas, retirou o telemóvel, que até já trazia um cartão pré-pago, julgava ele, ligou para o número do seu melhor amigo para lhe dar novidade da grande pechincha que tinha comparado, pensava ele que até poderia oferecer-lhe o outro telemóvel grátis que tinha recebido como bónus. Tocava nas teclas e na nada acontecia. O telemóvel não marcava nem dava sinal. Intrigado, resolveu ver se o cartão estava bem colocado no interior do telemóvel. Não valia a pena ir a uma casa de telemóveis era fácil detetar o problema do cartão. Abriu o telemóvel e, qual não foi o seu espanto, verificou que o interior do telemóvel estava vazio apenas existia a parte exterior do telemóvel que até era muito sofisticada.
Furioso, voltou para trás a correr para ver se apanhava o vendedor, mas em vão. Apenas viu um grupo de pessoas a vociferar contra o sujeito vendedor porque também tinham comprado o mesmo tipo de telemóvel. Dirigiu-se so grupo e perguntou aos também burlados onde se encontrava o sujeito dos telemóveis. A resposta foi rápida:
- Ah! Nada a fazer, ele apenas vem aqui de quatro em quatro anos.
Agora sobre a realidade.
Os debates televisivos entre líderes dos partidos são uma charada para a maior parte dos telespectadores. Como podem eles aferir da veracidade do que cada um afirma nos debates, que não são debates, mas autênticos circos de palavras, onde fazem passar promessas vãs e propostas alguma inexequíveis.
Segundo esses populistas e demagogos, as promessas serão cumpridas lá para 2028, se o forem. Sabemos porquê. Porque é o fim da legislatura e, para voltarem a captar votos, irão fazer por cumprir algumas das suas ténues promessas. Farão tudo para o conseguir, mesmo colocando as contas públicas em risco ao qual se seguem os cortes com a perda de tudo o que, entretanto, deram. Arranjarão desculpas para que não tenham podido cumprir o que prometeram. Como é que muitos de nós ainda caem nestas armadilhas ao fim de tantos anos de democracia?!
Desculpem-me a propaganda, mas as provas dadas e mais ou menos cumpridas só as temos do partido que nos governou até hoje, mesmo com espinhos pelo caminho, por culpa do próprio partido que, por vezes, pareceu andar distraído e com tapas nos olhos e descorando o que se passava à sua volta, daí uma das causas da sua queda. O Partido Socialista cometeu erro crassos aproveitado pelas oposições sobretudo da direita e da extrema-direita.
Tem-se falado muito acerca do problema da manipulação dos media que se tem intensificado nos últimos anos, sobretudo em relação à disseminação de notícias falsas pela internet.
Há uma pergunta que carece de ser respondida, que já foi investigada noutros países, é a de saber se em Portugal, por exemplo, a maioria das pessoas faz ou não distinção entre fake news (notícias falsas) e outros tipos de notícias. No entanto, o problema das fake news pode estar não apenas relacionado com os textos mediáticos fabricados nas notícias, mas também pela insatisfação geral do público com os meios de comunicação de massa tradicionais, e com alguns políticos, partidos e organizações.
Do ponto de vista do público, o problema das fake news não se limita às notícias falsas, diz também respeito ao jornalismo de baixa qualidade, à propaganda política, às formas enganosas de publicidade, à (des)confiança nas instituições públicas.
O facto de, no mundo dos media, as informações inequivocamente verdadeiras e explicitamente falsas estarem a tornar-se cada vez mais raras devido a técnicas de manipulação bastante sofisticadas que misturam informações confiáveis e falsas e que estão a ser usadas, pelo que não pode haver julgamentos simples sobre o desenvolvimento de mecanismos para banir ou remover informações falsas dos órgãos de comunicação.
A dúvida instala-se sobre o que pudemos esperar do verdadeiro jornalismo quando estes, por motivos de interesses vários, se encontram enfeudados a ideologias e partidos. À parte a pluralidade da publicação de artigos de opinião das diversas tendências político partidárias, o problema verifica-se quando há tendenciosamente critérios de subtil favorecimento a candidatos pela utilização das mais variadas técnicas de abordagens e alinhamentos programáticos.
Na sequência das estórias anteriores cabe agora aqui salientar os debates televisivos, servem para a cobertura política das campanhas porque atinge mais pessoas do que qualquer outro media, e também para atingir os que não se dariam ao trabalho de recorrer a essa informação noutros meios.
Devido à sua natureza visual e à perceção de credibilidade por vezes errada, a televisão é particularmente persuasiva. Assim, as pessoas confrontadas com mensagens consideradas persuasivas, são particularmente propensas a serem persuadidas porque um público não envolvido, ou diz não se interessar por política, é um público potencialmente persuasível em cujos efeitos desta armadilha provavelmente ocorrem.
Para os menos atentos, a capacidade da persuasão política dada pelos debates televisivos e pelas intervenções individuais dos líderes, quando em reportagens de eventos partidários, ou por declarações por interpelação de jornalistas, podem ser uma armadilha para os mais desprevenidos. Se não procederem a uma avaliação menos clubista e com emoção que por vezes é intencionalmente provocada pelos que os pretendem persuadir, e mais com base numa racionalidade efetiva podem cair decerto numa armadilha.