Acerca de "Votos por uma maioria plural de esquerda"
Incluo um texto de opinião publicado no jornal Público que justifica o pedido de votos para uma maioria de esquerda que teoricamente subscrevo quanto a partes do seu conteúdo, embora com muitas reservas. O texto em alguns pontos revela alguma demagogia e pretende ser um manifesto de colagem ao pensamento ideológico do BE e do PCP e em alguns dos seus argumentos.
Sou por uma maioria confortável do centro-esquerda e, caso essa impossibilidade, sou por alguns acordos de incidência parlamentar com partidos do centro-direita como o PSD se liderado como até agora por Rui Rio, mas que nada tenha a ver com aquilo a que pretendem chamar bloco central.
A experiência final de acordos com o BE e o PCP foram traumatizantes perturbadores da estabilidade. Estes dois partidos, como alguém já a firmou há algum tempo não são confiáveis devido às suas características de algum extremismo e historicamente revolucionárias que, por obrigação imposta pelas circunstâncias, se foram ajustando às regras democráticas com alguma contrariedade.
Em caso de emergência económica e financeira tendo em vista o crescimento não são partidos com que se possa contar. A sua posição de combate frontal a tudo quanto seja do domínio privado é prejudicial ao país. Pretendem o crescimento descontrolado da função pública por ser aí onde poderão angariar seguidores para sindicatos, greve e manifestações de contestação criando instabilidade social e, consequentemente, instabilidade política. As suas origens ideológicas apontam para um coletivismo que são fonte de imobilismo económico e social.
Todavia não se lhes pode tirar razão quando defendem um Serviço Nacional de Saúde público e universal, os direitos do trabalho, a escola e a universidade públicas, assim como a produção cultural e a defesa da preservação do planeta.
Ao longo das legislaturas não tem sido raro que aqueles partidos se juntem à direita em coligações parlamentares negativas apenas como oposição ao seu principal rival que, espante-se, não é a direita, mas o Partido Socialista, prejudicando assim o país e os trabalhores que dizem defender.
Por isso, embora pesando a honestidade intelectual e política dos signatários da carta, não defendo convergências com os partidos BE e PCP que contribuíram para o derrube de um Governo a meio de uma legislatura e que pretendem, agora, dar o dito pelo não dito para evitarem uma esperada queda de votos que milhares de portugueses não lhes irão dar.
Votos por uma maioria plural de esquerda
(in jornal Público, 04/01/2022)
Em 2015, os entendimentos à esquerda permitiram reverter medidas socialmente injustas e economicamente contraproducentes impostas pela troika e pelo Governo de direita. Mostraram também que foi possível fazer convergências à esquerda em torno de objetivos concretos, mesmo no quadro de constrangimentos europeus que continuam a limitar o alcance das mudanças. A longevidade da solução política então encontrada superou todas as expectativas iniciais.
Os signatários desta carta, que apoiaram desde a primeira hora as convergências à esquerda, entendem que a devolução do voto aos cidadãos, no atual contexto, não tem de ser um drama. Pode e deve ser uma oportunidade de clarificação sobre o projeto de desenvolvimento para o país.
Apesar de não termos militância partidária, entendemos que os progressos políticos verificados desde 2015, mesmo quando insuficientes, não teriam sido possíveis sem o empenho do BE, do PCP e do PEV, no quadro de uma maioria parlamentar de esquerda com o PS. Sem prejuízo do balanço diferenciado que fazemos das razões que levaram à interrupção da legislatura, sabemos que a concretização de uma agenda socioeconómica mais ambiciosa é uma tarefa que o PS, sozinho, não poderá cumprir.
Defendemos um Serviço Nacional de Saúde público e universal, que valorize os seus profissionais, travando assim a crise que a pandemia acelerou. Defendemos os direitos do trabalho, revertendo as leis laborais do tempo da troika, recusando que a evolução da economia nacional seja baseada nos baixos salários e na precariedade. Defendemos uma política de habitação pública que responda à especulação que expulsa jovens, pobres e a classe média dos centros das cidades e promove a segregação social e racial. Defendemos a escola e a universidade públicas, assim como a produção cultural e o respeito pelos seus profissionais. Defendemos a preservação do planeta, recusando encarar a urgência climática como uma oportunidade de negócios.
Sabemos, porque quase meio século de democracia nos ensinou, que isto só é possível se garantirmos e reforçarmos a diversidade e pluralidade do campo da esquerda. Sabemos, porque 2015 nos ensinou, que todos os deputados que elegemos contam e que o próximo governo será formado pela conjugação da vontade das diversas forças parlamentares, independentemente de qual venha a ser o partido mais votado. E sabemos que a reedição, formal ou informal, do bloco central só pode ser evitada se as esquerdas parlamentares saírem reforçadas.
O nosso apelo é que o dia 30 de janeiro sirva para promover uma maioria plural de esquerda. A mesma pluralidade que impediu o aprofundamento do retrocesso social que a troika e o Governo de direita quiseram impor. A mesma pluralidade que permitiu avançar com medidas para a justiça social e económica neste país. Seja qual for o futuro, só essa pluralidade pode construir o diálogo, a alternativa e a resistência. Sem ela, a esquerda derrota-se. Com pluralidade, a agenda de esquerda para um desenvolvimento mais justo e sustentável de Portugal sairá reforçada.
Os 100 subscritores:
Abílio Hernandez (professor universitário); Alberto Melo (professor); Álvaro Siza Vieira (arquiteto); Américo Monteiro Oliveira (membro da CE CGTP-IN); Ana Benavente (socióloga); Ana Cordeiro Santos (investigadora); Ana Costa (professora universitária); Ana Drago (socióloga); Ana Ferreira (investigadora); Ana Luísa Amaral (poetisa); Ana Petronilho (investigadora); André Carmo (professor universitário e sindicalista); António Pinho Vargas (compositor); Artur Cristóvão (professor universitário); Bárbara Bulhosa (editora); Bernardino Aranda (livreiro); Boaventura Sousa Santos (professor universitário); Carlos Seixas (programador); Carlos Vargas (jornalista); Carmo Afonso (advogada); Constança Cunha e Sá (jornalista); Cláudio Torres (arqueólogo); Daniel Oliveira (jornalista); Diogo Martins (economista); Domingos Lopes (advogado); Elisabete Moreira (professora); Fátima Sá (professora universitária); Fernanda Rodrigues (assistente social); Fernando Nunes da Silva (professor universitário); Fernando Paulouro das Neves (jornalista e escritor); Francisco Bethencourt (professor universitário); Gabriela Moita (psicóloga); Gonçalo Leite Velho (professor ensino superior); Guadalupe Simões (enfermeira e sindicalista); Henrique Barros (médico de saúde pública); Henrique Sousa (investigador social); Isabel do Carmo (médica); Isabel Lindim (jornalista); Ivan Dias (produtor); Joana Craveiro (encenadora e dramaturga); João Fazenda (ilustrador); João Leal (professor universitário); João Leal Amado (professor universitário); João M. Almeida (quadro superior); João Rodrigues (professor universitário); José António Bandeirinha (professor universitário); José Aranda da Silva (ex-bastonário da Ordem dos Farmacêuticos); José Carlos Martins (enfermeiro e membro da CE CGTP-IN); José Feliciano Costa (professor e sindicalista); José Luís Peixoto (escritor); José Maria Silva (dirigente associativo); José Neves (professor universitário); José Reis (professor universitário); José Vítor Malheiros (consultor); Lúcia Amante (professora universitária); Luís Miguel Correia (realizador); Magda Henriques (programadora cultural e professora); Manuel Correia Fernandes (arquiteto); Manuel João Ramos (professor universitário); Manuel Lisboa (sociólogo); Manuel Morais (agente principal unidade especial de polícia e antropólogo); Manuel San-Payo (artista plástico); Manuela Barreto Nunes (bibliotecária); Manuela Mendonça (professora e sindicalista); Manuela Ribeiro Sanches (professora universitária); Manuela Silva (médica); Margarida Santos (investigadora social); Maria Augusta Sousa (enfermeira); Maria Irene Ramalho (professora universitária); Maria José Espinheira (administrativa ); Mário de Carvalho (escritor); Mário Laginha (músico); Marta Delgado Martins (advogada); Marta Lança (jornalista e tradutora); Miguel Gonçalves Mendes (realizador); Miguel Real (escritor); Nuno Serra (geógrafo); Nuno Teles (professor universitário); Patrícia Bastos (professora universitária); Paula Cabeçadas (ativista política); Paulo Pedroso (sociólogo); Pedro Abrunhosa (músico); Pedro Estêvão (sindicalista e investigador); Pedro Messias (sindicalista e bancário); Pedro Vieira (escritor); Pilar del Rio (jornalista); Ricardo Paes Mamede (professor universitário); Rogério Moreira (gestor); Rui Bebiano (professor universitário); Rui Graça Feijó (investigador); Sérgio Antunes (arquiteto); Sérgio Tréfaut (realizador); Tatiana Salem Levy (escritora); Teresa Beleza (professora universitária); Teresa Dias Coelho (artista plástica); Teresa Villaverde (cineasta); Tiago Rodrigues (encenador); Ulisses Garrido (sindicalista); Victor Louro (engenheiro silvicultor); Vitorino Salomé (músico).