A política dos bodes expiatórios
De acordo com a religião judaica um “bode expiatório” era um animal que, depois de um ritual religioso, era abandonado à sua sorte na natureza selvagem levando os pecados da humanidade. Para o cristianismo o bode expiatório foi Jesus Cristo que expiou os pecados da humanidade sacrificando-se, pela morte, para a salvar dos pecados.
Em sentido figurado, que é aquele a que nos iremos referir, um “bode expiatório” é alguém ou um grupo que é escolhido, por vezes sem qualquer critério, para levar com as culpas de calamidades ou acontecimentos negativos sobre os quais não teve influência ou esta é reduzida.
A procura de um bodes expiatórios é um ato propagandístico e irracional que atribui a uma pessoa, grupo ou instituição, a responsabilidade de problemas que por eles não foram criados. A procura de bodes expiatórios faz parte de propagandas políticas cujo caso mais evidente que é conhecido se deu no tempo do nazismo em que os judeus eram considerados os responsáveis pelos problemas económicos e desintegração do sistema político na Alemanha.
Tudo isto vem a propósito porque os nossos atores políticos, mais concretamente os que se encontram atualmente no Governo e os seus apoiantes são useiros e vezeiros em procurar bodes expiatórios para os seus falhanços e, quando os encontram repetem-no até à exaustão.
O primeiro é o refúgio no passado desculpando-se com a herança da dívida e do défice do governo anterior. Embora haja razões para tal foi o PSD que derrubou o Governo de Sócrates, assumindo a responsabilidade de “salvar o país” e retirá-lo da crise.
O segundo, foi atribuir a responsabilidade da crise aos portugueses que se endividaram e gastaram acima das suas possibilidades.
A Constituição da República é outro bodes expiatórios que é um obstáculo ao desenvolvimento económico e não deixava que as reformas estruturais, diga-se cortes, fossem feitos.
Vieram depois os funcionários públicos, os reformados e os pensionistas como bodes expiatórios. Baseados em dados de origem e cálculo duvidoso são culpados da crise devido a auferirem rendimentos elevados (?) e que, por isso, havia que serem objeto de cortes de rendimentos para reduzir a despesa do Estado e o défice. O bode expiatório função pública que, para o Governo como causadora do aumento de impostos foi ainda utilizado para lançar trabalhadores portugueses do privado contra os do público.
Com o orçamento de 2012 foi o Tribunal Constitucional o bode expiatório das derrapagens no mesmo ano apesar de, relativamente aos pontos do orçamento considerados inconstitucionais, o TC possibilitasse que se mantivessem os cortes naquele ano.
A moção de censura do Partido Socialista foi também um potencial bode expiatório para justificarem a perda de credibilidade dos mercados e das avaliações da “troika” que eventualmente se verificasse.
Mais recentemente, e mais uma vez, o bodes expiatórios foi o Tribunal Constitucional por ter considerado a inconstitucionalidade de alguns dos pontos do orçamento de 2013. Repare-se que deveria ser obrigação do Governo saber à partida o que poderia ou não ser inconstitucional no orçamento. Quando não se sabe pergunta-se! Mas é mais fácil culpabilização de outros para se justificarem os falhanços das políticas aplicadas.
Mais recentemente foram os bancos, nomeadamente a Caixa Geral dos Depósitos que já foi objeto de ameaças, os bodes expiatórios por não financiarem a economia, o que já foi desmentido. Não há falta de financiamento, há é falta de investimento.
Sistematicamente, este Governo usa e abusa de bodes expiatórios para desculpar as suas incompetências e incapacidades na resolução de problemas que herdou porque quis ao derrubar o seu antecessor e, para além disso, criou outros e agravando tudo o que dizia tencionar melhorar.
Quando não conseguem arranjar bodes expiatórios apontam-se fantasmas para atemorizar. Um dos muitos fantasmas que agora acena-se com um segundo resgate e, consequente, mais austeridade. Podemos não estar longe disso, mas, se tal acontecer, a responsabilidade é apenas de Passos Coelho e do seu Governo que não conseguiram como prometeram, minimizar os efeitos do défice e crise.