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A invasão da Ucrânia de Trump a Putin II

22.11.24 | Manuel_AR

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A invasão da Ucrânia de Trump a Putin II

  1. Donald Trump o segundo ator da conspiração e o seu discurso de ódio.

A presidência de Donald Trump foi caracterizada por discurso que incitavam ao antagonismo e ao ódio mais agressivo do que o de Putin. Gonzalez, 2016, p. 28, escrevia numa publicação que a sua forma de se expressar variava entre negativa, irreverente e agressiva lesivas das minorias, inclusive discriminatórias e, algumas vezes, de apologia de delitos e que era um “ discurso que mostra um novo rosto do fascismo global que busca o confronto, a violência política e a justificação do Estado para se afastar dos valores legais e da ética pública em seu sentido universal”.

É aqui que entra o segundo ator da minha teoria da conspiração Donald Trump que antes e durante o seu mandato como presidente dos EUA expressava-se com um discurso extremista e no palco internacional parecia cooperar com Putin numa espécie de pacto informal para o enfraquecimento da União Europeia e da NATO tão desejados por Putin e para impor nos EUA um regime unipessoal e autoritário.

De acordo com muitos analistas e historiadores, a política possui movimentos pendulares que oscilam entre os campos ideológicos de esquerda e de direita. O pendulo na última década tem-se inclinado para a extrema-direita devido a populismos de regimes conservadores que, por sua vez, têm vindo a mostrar demagogicamente que são a melhor solução para os problemas decorrentes de crises económicas e iminentes ameaças internas e externas. Neste sentido, os governos de Donald Trump (Estados Unidos) e de Vladimir Putin (Rússia) têm chamado a atenção no cenário internacional. Poderemos de certo modo encontrar uma base ideológica comum de como interpretar o poder que evidencia uma possível aliança global entre eles.

Do lado de lá do Atlântico Donald Trump em janeiro de 2017 tomou posse como presidente dos Estados Unidos e traçou um caminho que, segundo ele, deveria “tornar a América grande outra vez”. Vladimir Putin, à semelhança de Trump, conforme afirmou na sua tomada de posse em 2018 era tornar a “Rússia grande”, e prosseguir na expansão territorial da sua área de influência. Repare-se na proximidade das datas e nas ocasiões dos dois presidentes em que foram feitas aquelas afirmações.

Putin não se escusou de afirmar que pretendia tornar a Rússia, não apenas novamente grande, mas ainda, tal como foi “grande” em 1945 quando o Exército Vermelho ocupou Berlim.

Trump em junho de 2015 ao anunciar que seria candidato em 2016 nas eleições presidenciais dos EUA disse que se comprometia a “tornar a América grande novamente”.

Antes de Donald Trump terminar o seu mandato em junho de 2021 Vladimir Putin, em janeiro do mesmo ano, numa nova tentativa para consolidar as suas opiniões publica o ensaio “Sobre a Unidade Histórica de Russos e Ucranianos“ em que faz uma revisão histórica, conforme aos seus interesses, negando a realidade histórica de qualquer estado ucraniano separado de uma Grande Rússia.

A ideia de uma conspiração de que a Rússia está a ser alvo por parte do Ocidente e de que a Ucrânia está a ser usada pelo Ocidente como parte de um plano para enfraquecer e até mesmo destruir a Rússia serve para consolidar a estratégia de Putin para endurecer a guerra e fazer ameaças. Os seus fiéis também dizem que a Ucrânia está a preparar-se para a guerra há algum tempo, com a ajuda dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha. Esta parece-me ser a teoria da conspiração sustentada por Putin que Trump aprova, conforme relatos das suas declarações. O grande problema é que, à volta de Putin, há gente extremista que só lhe diz o que ele quer ouvir, por medo ou por adulação.

Hoje, 10 de julho, data em que escrevo estas linhas, a agência russa de notícia Tass e a NewsFront, apresentando-se esta última como agência de notícias e meio de contra a desinformação e a propaganda,  particularmente focado em apoiar as forças da Rússia na Ucrânia e lutar, segundo diz, contra uma guerra de informações e de ataques injustos à Rússia, publicavam que o ex-líder americano Donald Trump ao falar no sábado aos seus apoiantes em Anchorage (Alasca) num comício transmitido por empresas de televisão conservadoras americanas terá dito que “acredita que não permitiria um conflito na Ucrânia em caso de reeleição nas eleições presidenciais de 2020 nos Estados Unidos”. O referido site de notícias acrescenta ainda que, quanto à Ucrânia, de acordo com a sua previsão, a situação nesta região só irá piorar, mas tudo isso poderia ter sido evitado se as eleições de 2020 tivessem corrido de forma diferente. A mesma fonte acrescentou ainda que a “fraqueza e incompetência” de Biden “levou ao agravamento da situação, o que certamente não teria acontecido sob sua administração”, referindo-se a Trump. Numa pesquisa que efetuei aos media dos EUA não se encontram referências, relativamente àquelas afirmações de Trump no referido comício. Todavia, poderão ter sido referidas em alturas diferentes. Como se verá adiante a afirmação de Trump não terá sido difundida no comício, mas sim  através do Tweet.

O jornal online mais lidos no estado do Alasca, Anchorage Daily News, escrevia num artigo de opinião publicado em 7 de julho do corrente que “Trump é a melhor esperança da Rússia para desestabilizar a nossa democracia”. Não se tratava de especulação porque, de facto, em 19 de dezembro de 2020 Trump escreveu num tweet que “Grande protesto em Washington em 6 de janeiro. Esteja lá, será selvagem!” Este tweet de Trump acabou por ter um efeito violento em grupos de milícias de extrema-direita. Mais grave ainda é a mensagem que escreveu no Twitter em 10 de julho de 2022 que foi divulgada pela Nexta TV, meio de comunicação bielorrusso distribuído principalmente através dos canais Telegram e YouTube:

Somos o Estado que permitiu que a Rússia devastasse a Ucrânia, matando milhares de pessoas. E a situação só vai piorar, embora isso não pudesse ter acontecido se as eleições tivessem sido realizadas de forma diferente”. A obsessão por enganar o povo americano de que houve fraude nas eleições mantêm-se.

Numa polémica digressão pela Europa em maio de 2017, já como presidente, Trump colocou de pernas para o ar as relações de aproximação com os EUA que vinham do pós-guerra, confrontando os principais líderes dos aliados, sobretudo a Alemanha, o que ampliou as divergências entre os países aliados da Europa. Esta atitude levou-o a ganhar o apelido de “destruidor dos valores ocidentais” que lhe foi atribuído por Martin Schulz, na altura líder do Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD) e candidato à chefia do governo que acrescentou que a resposta é “uma Europa mais unida”. As declarações de Trump foram no sentido contrário ao que Putin esperava ao mandar invadir a Ucrânia que era ver uma U.E. desunida.

No seguimento das afirmações agradáveis a Putin, Trump intensificou uma espécie de discórdia e criticou importantes aliados da NATO pelos seus gastos militares e recusou-se a apoiar um acordo global de combate às mudanças climáticas saudando ainda a saída da Grã-Bretanha da U.E. Para ambos seria o princípio para o desenho de uma Europa desunida e enfraquecida.

Não é de rejeitar a ideia de que a critica de Trump à NATO e a sugestão de um acordo com a Rússia para reduzir os arsenais nucleares e aliviar as sanções com Moscovo tenha, na altura, deixado Putin muito satisfeito. Putin terá visto em Trump um potencial aliado para alguns dos seus projetos que coincidiam com os de Donald Trump tais como o enfraquecimento da NATO e desmembramento da U.E.

Porém, os comentários de Trump causaram consternação entre os países do leste europeu que aderiram à NATO por estarem incomodados com Moscovo, após a anexação da Crimeia, república autónoma da Ucrânia anexada pela Rússia em 2014, facto que gerou o conflito na região e que perdura até hoje. Depois disso seguiu-se a invasão da Ucrânia.

Após a vitória eleitoral em janeiro de 2017 e a tomada de posse de Trump o secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, chegou a dizer que a aliança foi uma base de segurança transatlântica por quase 70 anos, reforçando ainda que nestes tempos, face aos novos desafios que se perfilam, essa alinaça impõe-se como imprescindível e especialmente necessária.

As aproximações e simpatias de Trump por Putin não se ficam por aqui. Denegrindo o seu antecessor, o presidente dos EUA Barak Obama, Donald Trump disse em setembro de 2016 à cadeia de televisão NBC que considera Putin um líder mais forte do que Barack Obama. As suas palavras são claras: “Eu já disse, que ele é realmente muito bom líder…  o homem tem um controle muito forte sobre o país”, disse Trump. E acrescentava “Agora, é um sistema muito diferente, e eu não gosto do sistema. Mas, certamente, nesse sistema, ele tem sido um líder, muito mais do que o nosso presidente tem sido um líder”.

Donald Trump chegou a elogiar Vladimir Putin pelo seu artigo de opinião publicado no New York Times em 2013 no qual criticava a frase onde o Presidente Obama aplicou o termo “excecionalismo americano”. Passo a citar a frase que Putin escreveu:

A minha relação pessoal e de trabalho com o Presidente Obama é marcada por uma confiança crescente. Eu agradeço isso. Estudei cuidadosamente o seu discurso à nação na terça-feira. E eu prefiro discordar de um caso que ele fez sobre o excecionalismo americano, afirmando que a política dos Estados Unidos é “o que torna a América diferente. É o que nos torna excecionais.” É extremamente perigoso encorajar as pessoas a verem-se como excecionais, qualquer que seja a motivação. Há grandes países e pequenos países, ricos e pobres, aqueles com longas tradições democráticas e aqueles que ainda encontram o seu caminho para a democracia. As suas políticas também diferem. Somos todos diferentes, mas quando pedimos as bênçãos do Senhor, não devemos esquecer que Deus nos criou iguais.

Estas palavras de Putin parecem-me ser de um cinismo sem limites que acabou por revelar ao contradizer-se entre o pensamento e o ato de invadir a Ucrânia em fevereiro de 2022.

A admiração de Trump por Putin foi ao ponto de elogiar o artigo que Putin escreveu no The New York Times onde fez observações críticas sobre o líder dos EUA na época. Dizer que foi “incrível” ao comentar as críticas vindas de um líder de outro país, de certo modo antagonista, não se coaduna com o estatuto de um candidato à Presidência que utilizou palavras como “Foi simplesmente incrível. Ele disse tanto e o disse de uma forma muito agradável, mas não foi nada bom.”, afirmou Trump que acrescentou: “Obama está tendo um tempo muito, muito difícil.”.

Durante a campanha para a eleição presidencial de 2016 Donald Trump não teve acanhamento elogiar as palavras de Putin o que deu lugar a um comentário no New York Times sob o título “Vexing His Allies, Trump Keeps Up Praise of Putin”, página 9, onde se escrevia que “A campanha de Donald Trump reafirmou o seu caloroso apoio a Vladimir Putin. Trump observa com admiração que Putin goza de 82% de apoio público na Rússia”. Não espantaria que encontrasse um tipo ainda mais admirável em Estaline, sob cuja liderança o Partido Comunista da União Soviética ganhou com 99,7% dos votos nas eleições de 1950 para o Soviético Supremo.

A isto merece acrescentar que Putin pôde escrever o que pensa num jornal livre e independente do ocidente que lhe publicou o artigo. As declarações de Trump, na altura candidato à presidência de um país soberano, livre e independente, não é usual no âmbito das relações institucionais fazer-se elogios e comentários pouco abonatórios, embora com alguma fineza como disse Trump, sobre um seu antecessor vindos de um líder de um país oponente.

As relações de aproximação de Trump com Putin reveladas por afirmações mais ou menos polémicas são várias. As primeiras que os media noticiaram encontradas nas pesquisas efetuadas reportam ao ano de 2013 e seguintes. Algumas são vulgares, sem grandes implicações na política, mas são demonstrativas da aproximação de Trump e Putin.

Trump escreveu no Twitter em 18 junho de 2013:

“Você acha que Putin irá ao concurso Miss Universo em novembro em Moscovo? Se assim for, ele vai tornar-se o meu novo melhor amigo? Donald J. Trump (@realDonaldTrump).

(A conta de Trump nesta rede social encontra-se suspensa.)

Trump elogia Putin pela sua crítica ao termo “excepcionalismo americano”:

“Você pensa no termo como sendo bom, mas de repente você diz, e se você estiver na Alemanha ou no Japão ou em qualquer um dos 100 países diferentes? Você não vai gostar desse termo”, disse Trump à CNN. “É muito insultante e Putin realmente aplicou-lhe isso”. (referia-se a Obama)”.

Em 3 de outubro de 2013 no programa “Politicking with Larry King - Ora TV” Donald Trump disse que Putin fez “um ótimo trabalho ao superar o nosso país”. Dias depois, 17 de outubro, no programa da CBS “Late Show” com David Letterman, Donald Trump confirma que fez “muitos negócios com os russos” e que são “inteligentes” e “durões” e que agora não “parecem tão burros”. Ele chama a Putin “durão” e diz  que o “conheceu uma vez”.

Na altura do concurso de Miss Universo realizado em 9 de novembro de 2013 nas proximidades de Moscovo Trump disse que Putin entrou em contacto com ele e que foi “tão formidável”, (palavras de Trump ‘so nice’). Na “Fox and Friends”, programa de notícias americano emitido pela Fox News afirmou que: “Quando fui à Rússia durante o concurso de miss Universo, Putin contactou-me e foi formidável. Quero dizer, o povo russo foi fantástico connosco”. “Eu só vou dizer isso, o que eles estão a fazer, em muitos momentos eles estão a enganar-nos, como todos nós entendemos. Quero dizer, os seus líderes são, quer você os chame mais espertos ou mais astutos ou o que seja, mas eles estão a enganar-nos. Se você olhar para a Síria ou outros lugares, eles estão a enganar-nos”. (Pode consultar nos arquivos da FoxNews).

Em 2014, durante um discurso na CPAC - Conservative Political Action Conference, evento político promovido pelo partido conservador dos Estados Unidos, Trump gabou-se de se encontrar com os conselheiros de Putin e até mesmo de receber um presente e uma nota pessoal de Putin durante o concurso Miss Universo em Moscovo. Alguns órgãos de comunicação nos EUA noticiaram que Donald Trump durante o tempo que durou o concurso de Miss Universo em 2014 fez vários elogios a Putin e orgulhou-se de receber presentes de Putin e de se encontrar com os seus conselheiros.

A admiração aberta por Putin entre alguns grupos da direita americana representa uma reversão do período da Guerra Fria, quando os republicanos conservadores eram famosos antissoviéticos. Em 2012, o candidato presidencial republicano Mitt Romney descreveu a Rússia como o "inimigo geopolítico número um da América". Com a eleição de Donald Trump para a Casa Branca, o sentimento anti russo foi substituído pela admiração pela personalidade forte de Putin e pela postura antiliberal e antidemocrática do seu regime. "O facto de Trump admirar abertamente Putin significava que muitos de seus apoiantes também admiravam abertamente Putin ", constava nos meios políticos republicanos. Os admiradores de Putin da elite política e dos media nos EUA incluem o agitador de ultradireita Steve Bannon e ex-assessor de Trump da Casa Branca.

Nos EUA o apresentador de televisão Tucker Carlson, comentarista e analista político da Fox News, argumentava em 28 de fevereiro de 2022 que a única razão pela qual os americanos odeiam Putin é porque foram vítimas de uma campanha de propaganda e que o verdadeiro inimigo são os liberais internos não republicanos. Muitos anos antes já o ex-conselheiro de Trump e Carlson tinham difundido a ideia e o apoio a um movimento autoritário que juntaria apoiantes de Trump nos EUA a líderes de extrema-direita no exterior.

Na altura da invasão da Ucrânia por Putin a comunicação social nos EUA, afeta ao partido republicano, atacou Biden como sendo um fraco e elogiava Putin e Trump em vez de culpar o agressor por atacar o seu vizinho mais fraco, culpava Biden por supostamente ter lançado o epíteto de fraqueza e vulnerabilidade a Putin. Se nos recordamos foi Biden quem acionou a resposta diplomática internacional de sanções económicas contra a Rússia numa aproximação com a U.E. Contudo, comentaristas de direita continuam a declarar que Putin é o único que representa o tipo de líder forte que eles realmente preferem, o mesmo se tem passado aqui em Portugal com os apoiantes dele.

Fazem-se comentários televisivos, nomeadamente na Fox News e nas redes sociais que formulam realidades alternativas que têm sido denunciadas pela “Media Matters for America”, centro de pesquisa e informação dedicado a monitorizar, analisar e corrigir desinformação conservadora nos media dos EUA, enquanto a Fox e outros meios de comunicação republicanos trabalharam anteriormente para encobrir a relação amigável de Trump com Putin quando ele estava na presidência.

Segundo a revista VanityFair a seguir à da invasão da Ucrânia, num evento nacionalista branco, depois do discurso da congressista republicana Marjorie Taylor Greene, Nick Fuentes, organizador do evento abertamente racista, liderou a multidão com gritos de "Putin, Putin" e de elogios a Adolph Hitler.

Para Trump e os seus adeptos fascistas e autoritários, a invasão russa à Ucrânia poderá ter sido um ponto de viragem numa espécie de guerra política contra a democracia que se tem evidenciado em todo o Mundo. Mas este efémero triunfo parece ter desaparecido porque as forças pró-fascistas e autoritárias terão subestimado a resistência ucraniana e o sentimento pró-democrático que a guerra inspirou. As sanções contra a Rússia parecem causar sérios danos, e os trumpistas parecem ter começado a recuar rapidamente.

Dois dias depois da entrada das tropas de Putin no leste da Ucrânia e ainda que Trump se tenha mostrado como sendo o mais indicado para se opor a Putin, a maioria dos republicanos do Congresso apoiou a promessa de Biden de impor sanções esmagadoras à Rússia. Alguns até elogiaram os movimentos de Biden, como o envio de tropas adicionais dos EUA para a Europa Oriental para reforço das defesas da NATO.

Recordemos que no passado não muito longínquo Donald Trump, ainda antes de se candidatar a presidente, numa espécie de pré campanha, criticava o presidente Obama por não tomar posição mais dura contra o presidente Vladimir Putin no caso da Ucrânia, dizendo que temia que Obama fosse compensar o tempo perdido com movimentos imprudentes para “mostrar a sua masculinidade”.

Nessa mesma altura, Obama em declarações à imprensa após uma reunião em Varsóvia com Poroshenko – que liderou a Ucrânia entre 2014 e 2019, que foi derrotado por Zelensky, atual presidente da Ucrânia - dizia que “O governo dos Estados Unidos está completamente comprometido em permanecer ao lado do povo ucraniano, não apenas nos próximos dias ou semanas, e sim nos próximos anos”.

Estamos agora profundamente preocupados com os relatos de movimentações militares feitos pela Federação Russa dentro da Ucrânia“ disse Obama acrescentando que qualquer violação da soberania e da integridade territorial da Ucrânia será “profundamente desestabilizadora”, e que “Os Estados Unidos colocar-se-ão com a comunidade internacional na afirmação de que haverá custos para qualquer intervenção militar na Ucrânia”. Estávamos em fevereiro de 2014.

No dia 1 de março a comunicação social alertava que Kiev tinha denunciado nessa noite uma “invasão armada” da Crimeia por mais de 2.000 soldados russos aerotransportados para Simferopol, capital da república autónoma do sul da Ucrânia. Cerca de oito anos depois Putin invade a Ucrânia.

Em 21 de março do mesmo ano Trump escrevia no Twitter

“acredito que Putin continuará a reconstruir o Império Russo. Ele não tem respeito por Obama ou pelos EUA!”, (@realDonaldTrump, conta, suspensa pela rede social no final do seu mandato como presidente).

Se, por um lado, Donald Trump elogiava Vladimir Putin, por outro, criticava-o por enviar tropas militares para a Crimeia considerando-o imperialista e sem consideração para com os EUA e para com o seu então presidente Obama.  

Em agosto de 2016 Donald Trump numa entrevista à cadeia de televisão ABC (31 de julho) que serviu mais para atacar Obama do que para esclarecer,  afirmava que o presidente russo Vladimir Putin não faria um movimento militar para a Ucrânia, embora Putin já tivesse feito exatamente isso, capturando a Península da Crimeia e acrescentava categoricamente que Putin não iria invadir a Ucrânia. Como quem o entrevistava contrariou-o dizendo que Putin já lá estava referindo-se à Crimeia, e que tinha feito exatamente isso, apreendendo a Península da Crimeia da Ucrânia no início de 2014. Trump respondeu-lhe: “OK - bem, ele está lá de uma certa maneira. Mas eu não estou lá. Quem lá está é Obama. E, francamente, toda essa parte do mundo é uma bagunça na presidência de Obama apesar da força que refere e de todo o poder da NATO”. “Todavia, o presidente russo Vladimir Putin não fará um movimento militar para a Ucrânia”.

As contradições de Trump quando se refere a Putin são muitas e variadas e sobre as declarações da sua relação pessoal com Putin afirmava numa entrevista que “Eu não tenho nenhuma relação com Putin. Não, não tenho nenhuma relação com Putin”, e acrescentava dirigindo-se ao seu interlocutor: “Só para você entender, ele disse coisas muito boas sobre mim. Mas não tenho nenhuma relação com ele. Não, eu nunca o conheci”. Porém, num debate durante as eleições primárias em novembro de 2015, Trump havia dito sobre Putin: “Eu conheci-o muito bem porque os dois estávamos no '60 Minutes', (programa do canal CBS), éramos companheiros”. Vale a pena ler partes da transcrição dessa entrevista inserido num artigo da CNN em 2016 incluído nas fontes no final do artigo.

Trump afirmou numa entrevista ao canal de televisão ABC, “This Week” em 31 de julho de 2016, que alguns conselheiros chamaram assustadora, levou a uma resposta de um deles da campanha de Ellery Clinton a questionar do que Trump estaria a falar pois a “A Rússia já está na Ucrânia. Ele não sabe disso? O que mais ele não sabe?”. “Trump repetiu “corajosamente” o argumento de Putin de que se justificava a Rússia tomar o território soberano de outro país à força. Isso é assustador”, disse o conselheiro da campanha num comunicado.”, acrescentando que “isso vem na esteira do seu convite tácito aos russos para invadirem os nossos aliados da NATO na Europa Oriental.”

Em síntese: Donald Trump sugeriu que os EUA aceitassem a anexação da Crimeia pela Rússia porque isso levaria a melhores relações com Moscovo.  Era na altura uma visão contra o governo de Obama, que impôs sanções económicas contra a Rússia por ter anexado o território na Ucrânia em 2014. As Nações Unidas também não quiseram que os países reconhecessem a Crimeia como parte da Rússia, e alguns dos principais republicanos defendiam firmemente a Crimeia contra o que consideram agressão russa.

Uma década atrás, 2012, Mitt Romney, candidato do Partido Republicano à presidência dos Estados Unidos contra Barack Obama fez uma declaração que, na altura, foi amplamente percebida como um grande erro. Disse numa entrevista à CNN que a Rússia, é, sem dúvida, nosso inimigo geopolítico número um. Eles lutam por todas as causas e pelos piores atores do mundo.”.

Trump parece ter dado um volte-face concordando com o que Romney tinha dito, “Eles riram. Acontece que ele está absolutamente certo. Você olha para o que a Rússia está a fazer com o Irão, como eles controlaram a situação, e a Síria, e praticamente todos os outros lugares… fomos expulsos de todos. Não estou a dizer que deveríamos estar lá… ser ridicularizado e jogado para fora da forma como estamos a ser jogados fora é absolutamente impensável.”  Estas afirmações contrastam com as de abril de 2014 como anteriormente referi quando ele disse que “Acabamos de sair de Moscovo”, “Ele não poderia ter sido mais agradável. Ele foi tão excelente e tudo mais. Mas você tem que dar-lhe o crédito ao que ele está a fazer por esse país, é muito forte em termos do seu prestígio mundial.”. E também em 16 de junho de 2015, Trump faz comentários semelhantes à FoxNews “Eu estive em Moscou há dois anos e eu vou dizer-lhe – você pode dar-se bem com essas pessoas e dar-se bem com elas. Você pode fazer acordos com essas pessoas. Obama não pode”.

Ainda em 20 de dezembro de 2015, numa entrevista ao programa “This Week”, da ABC, Trump defendeu Putin sobre as alegações de que ordenou a morte de jornalistas e dissidentes afirmando que: “No que diz respeito aos repórteres obviamente eu não quero que isso aconteça. Eu acho que é terrível, horrível. Mas, para ser justo com Putin, está a dizer que ele matou pessoas. Eu não vi isso. Não sei se ele o fez. Conseguiu provar isso? Sabe os nomes dos repórteres que ele matou? Porque eu tenho ouvido isso, mas eu não vi o nome. Agora, eu acho que seria desprezível se isso ocorresse, mas eu não vi nenhuma evidência de que ele matou alguém em termos de repórteres.”.

Em dezembro de 2016 também na Fox News disse que Putin é como um “animal ferido” devido às ações do governo Obama contra a Rússia”. “Ferimos a Rússia e fizemos certas coisas que realmente prejudicaram a Rússia”, disse ele. “Eu não sei se é uma coisa boa ou se isso é uma coisa ruim. Vamos ver o que acontece”.

Em 26 de janeiro de 2016 numa entrevista a Maria Bartiromo da Fox Business Network, canal americano de televisão, Trump volta à defesa de Putin quando foi referido o assassinato de Alexander Litvinenko em 2006, um ex-agente de segurança russo, e as conclusões de um inquérito britânico que referia que Putin “provavelmente aprovou” o seu envenenamento. De imediato Trump perguntou e respondeu: “Eles declararam-no culpado?”. “Eu não acho que eles o declararam culpado.” “Se ele fez isso, tudo bem. Mas não sei se foi ele. Sabe, as pessoas estão a dizer que acham que foi ele, pode ter sido, poderia ter sido. Mas, com toda a justiça para Putin, eu não sei. Você sabe, e eu não estou a dizer isso porque ele disse que ‘Trump é brilhante e lidera todo mundo’, o facto é que, você sabe, ele não foi condenado por nada.”

O encanto com Putin continuou e em janeiro de 2017 Trump diz na CNN acreditar que a Rússia foi responsável pelo ataque hacker ao partido democrata: “Acho que foi a Rússia”, disse Trump, acrescentando que Putin “não deveria estar a fazer isso”. “Ele não vai fazê-lo. A Rússia terá muito mais respeito pelo nosso país quando eu o liderar do que quando outras pessoas o lideraram”, disse Trump. Disse ainda também acreditar que um bom relacionamento com Putin seria um trunfo.

Já como presidente Trump em 2017 declara numa entrevista dirigindo-se ao entrevistador: “Eu adoraria poder dar-me bem com a Rússia. Agora, você teve um monte de presidentes que não tomaram essa atitude. Olhe onde estamos agora. Olhe onde estamos agora. Então, se eu puder, agora, eu gosto de negociar as coisas, faço isso muito bem, e todas essas coisas. Mas… mas é possível que eu não seja capaz de me dar bem com Putin.”.

Para Trump, Putin mais parece um grande amigo que tenta defender mesmo dando descaradamente nas vistas.

Sobre acordos nucleares com a Rússia, segundo The Times of London, numa entrevista publicada em 2017, já como presidente eleito, criticando a anterior política externa dos EUA, disse que proporia a Putin oferecer o fim das sanções impostas à Rússia devidas à anexação da Crimeia em troca de um acordo de redução de armas nucleares. “Eles têm sanções sobre a Rússia, vamos ver se podemos fazer alguns bons acordos com a Rússia. A Rússia está a sofrer muito por causa das sanções, mas acho que algo pode acontecer e que muitas pessoas vão beneficiar.”.

As ligações de Trump a Putin são por demais conhecidas durante a sua presidência entre 20 de janeiro de 2017 e 20 de janeiro de 2021. A política de Putin nas suas relações com o mundo ocidental estava a correr-lhe bem. O presidente americano, assim como Putin, parecia mostrar ser um seu admirador e partidos políticos pró-russos e de extrema-direita entendiam-se e estavam a prosperar na Alemanha, Itália, Áustria, França e noutros países.

Alguns deles devido à invasão da Ucrânia fecharam-se nas suas conchas e olham de lado para Putin o que pronuncia afastamento, com foi o caso do RN - Rassemblement National em França. Por cá, no nosso país, isso não aconteceu, mas, nas redes sociais e alguns, poucos, comentadores, alguns simpatizantes da esquerda radical, lá vão puxando a brasa para o lado de Putin.

Donald Trump falava sobre a influência da NATO e, supostamente, planeava retirar-se da organização num segundo mandato, chegando até a comentar que até lá “Talvez a NATO se dissolva, e tudo bem, isso não é a pior coisa do mundo“ afirmou na altura. A União Europeia também estava na mira de Donald Trump. Numa entrevista à CBS Evening News Donald Trump em julho de 2018, horas antes de ir para Helsínquia para uma reunião política, quando lhe foi pedido para identificar globalmente o seu “maior inimigo no momento” indicou a União Europeia, composta por alguns dos aliados mais antigos dos EUA afirmando que: “Acho que nós temos um monte de inimigos. Penso que a União Europeia é um inimigo pelo que faz connosco no comércio. Agora, você acharia isso da União Europeia, mas eles são um inimigo.”. E acrescentou que “A Rússia é inimiga em certos aspetos. A China é um inimigo economicamente, certamente que eles são um inimigo. Mas isso não significa que eles são maus. Não significa nada. Significa que eles são competitivos”.

Surpreendido o jornalista que o entrevistava respondeu-lhe que “Muitas pessoas ficariam surpreendidas ao ouvir o senhor presidente mencionar a U.E. como um inimigo, mais do que a China e a Rússia”. Trump insistiu que: “A U.E. é muito difícil. Respeito os líderes desses países. Mas no aspeto comercial eles realmente aproveitaram-se de nós.” Isto é, para Trump os EUA são explorados pelos seus aliados. Estas afirmações não levantam dúvidas, mesmo para quem ainda as tivesse sobre a suas intenções anti U.E., que coincidiam com as de Putin.

Ainda na mesma altura e sobre o Brexit, Donald Trump aconselhou Theresa May a processar a EU. Segundo a ex-primeira-ministra britânica o presidente ter-lhe-á dito para ela não se preocupar em negociar com Bruxelas, mas para levar todo o bloco comercial ao tribunal. Ao jornal SUN Trump ameaçou, quando disse que o novo modelo de Brexit suave que Theresa May queria negociar, se fosse proposto, “mataria” qualquer futuro acordo comercial com os Estados Unidos.

Estas declarações levaram o presidente do conselho europeu, na altura Donald Tusk, numa entrevista dada em 2018 a dizer que “A América e a U.E. são melhores amigas. Quem diz que somos inimigos está a espalhar notícias falsas.”,  frase que foi colocada no Twitter.

O alinhamento de Vladimir Putin com Trump nas intenções em relação à U.E., com algumas diferenças nos objetivos, foram confirmadas por Ângela Merkel, em 7 de junho de 2022, num colóquio em Berlim . Disse ela que “nunca foi ingénua” em relação ao “ódio” de Putin ao modelo ocidental de democracia, tendo alertado diversas vezes líderes internacionais de que o objetivo do líder russo era destruir a Europa.

Por coincidência, Joe Biden tomou posse como Presidente dos EUA em 20 de janeiro de 2021, Vladimir Putin invade a Ucrânia cerca de um ano e um mês depois de Donald Trump ter saído da cena da presidência. Isto diz-nos alguma coisa.  Mas, se dúvidas existissem elas são afastadas por factos que mostram uma sintonia entre ambos os presidentes, mesmo depois da invasão da Ucrânia.

Parece estar a surgir nos EUA uma tendência que aparenta que o Partido Republicano estar cansado de Donald Trump. Segundo uma nova sondagem, 51% dos eleitores republicanos dizem que preferem outro candidato presidencial em 2024. Apesar do descontentamento, a sondagem indica que mais eleitores (44%) vão votar em Biden do que no candidato do Partido Republicano, em 2024, se o escolhido voltar a ser Donald Trump (41%).

Entretanto, segundo a CNBC, a 10 de junho as conclusões de 'CPI'- Comissão Parlamentar de Inquérito acusa Trump de orquestrar 'tentativa de golpe' com invasão do Capitólio. O ex-presidente americano Donald Trump foi acusado por uma comissão parlamentar de inquérito de ter orquestrado a invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021 numa "tentativa de golpe". A acusação foi feita na primeira sessão televisiva da investigação realizada ao longo de 11 meses, num evento sem precedentes na política dos Estados Unidos.

Antes e depois da invasão da Ucrânia, ao desconhecer-se até onde vai e o que quer Vladimir Putin que tem por vezes obrigado o ocidente, e sobretudo a Europa a esforços diplomáticos desmedidos, Donald Trump, antes e durante o seu mandato na presidência, não ajudou em nada, antes pelo contrário. Ao elogiar Putin, Trump criou anticorpos na Europa e nos EUA manifesto num artigo de opinião no “The Washington Post” publicado no dia 22 de fevereiro de 2022 com a epígrafe “Com os seus elogios à invasão da Ucrânia por Putin, Trump faz os seus defensores parecerem tolos. Outra vez.”, e no The Guardian, na mesma data, “Trump elogia 'génio' Putin por enviar tropas para o leste da Ucrânia”. Há cerca de dez anos, pelo menos, que Putin desafia o Ocidente, infringido as leis internacionais, ignorando fronteiras e ocupando parte de dois países independentes: primeiro a Geórgia, depois o resto da Ucrânia que no início do ano resolveu invadir. Ele não esconde a sua política “revisionista” da ordem internacional, uma nova ordem como ele diz, para reconquistar as “zonas de influência” da ex-União Soviética, perdidas ao que chama derrota na Guerra Fria. Durante a presidência de Donald Trump, Putin parecia ter encontrado uma alma gémea no presidente de uma superpotência que são os EUA e cujo objetivo seria entender-se com ele. Atualmente começam a verificar-se crescentes resistências internas nos EUA, mesmo entre republicanos, à sua recandidatura. Se assim for ficarão apenas o que restar desse seu meio-irmão.

Fontes:

  1. https://www.researchgate.net/publication/327067109_Alexander_Dugin_Some_Conclusions_Concerning_Fourth_Political_Theory
  2. Alexander Dugin: Some Conclusions Concerning Fourth Political Theory
  3. https://www.researchgate.net/publication/327067109_Alexander_Dugin_Some_Conclusions_Concerning_Fourth_Political_Theory
  4. https://books.google.pt/books/about/The_Fourth_Political_Theory.html?id=Wh5afAZ-GmgC&redir_esc=y
  5. https://www.latimes.com/world-nation/story/2022-03-28/putin-ultranationalism-ideology-russia-ukraine
  6. http://grachev62.narod.ru/dugin/chapt04.htm
  7. https://www.france24.com/en/20170116-trump-nato-obsolete-brexit-great-thing
  8. https://www.bostonglobe.com/news/politics/2016/09/08/trump-keeps-praise-putin-vexing-republican-allies/psmuaCoqGLVBeS2PkPmELO/story.html
  9. https://www.nytimes.com/2016/09/10/opinion/donald-trumps-admiration-for-vladimir-putin.html
  10. https://www.mediaite.com/online/putin-writes-ny-times-op-ed-syria-strike-would-increase-violence-boost-terrorism/
  11. https://abcnews.go.com/Politics/week-transcript-donald-trump-vice-president-joe-biden/story?id=41020870
  12. https://www.adn.com/opinions/2022/07/07/opinion-trump-is-russias-best-hope-for-destabilizing-our-democracy/
  13. https://en.news-front.info/2022/07/10/trump-says-would-not-let-let-the-conflict-in-ukraine-escalate/
  14. https://edition.cnn.com/2016/07/31/politics/donald-trump-russia-ukraine-crimea-putin/