A derrocada do CDS
Não sou politólogo nem especialista em análise nem em comentário político, observo e avalio o que me chega pelos órgãos de comunicação social e por via dos intérpretes partidários numa perspetiva umas vezes emotiva, outras mais racional com isenção e distanciamento, o que às vezes nem sempre é possível. As minhas interpretações não partem de investigações empíricas ou de vivências partidárias, são apenas opiniões.
O que hoje me levou a desenvolver estas minhas reflexões foi o desaparecimento do CDS do círculo da política parlamentar que, apesar de nunca ter sido eleitor e ter sido bastante crítico deste partido acho que foi uma perda para a democracia, assim como foi mau para a democracia o surgimento desse simulacro de partido que dá pelo nome de Chega e que, mesmo numa ótica de extrema-direita, é uma aberração. Com todo o respeito pelas artes circenses, este partido a fazer política é como um circo de feira das mais rascas. Mas a democracia pluralista tem destes fenómenos a que ela própria tem de dar resposta.
Centrando-me no CDS e interrogo-me sobre as causas que terão levado a que este partido tenha desaparecido do Parlamento e que, se não houver quem o “agarre”, possa estar prestes a desaparecer da democracia.
Muitos analistas já estão a dissertar sobre as causas e apontam as mais sofisticadas razões para tal causa. Eu, tenho a minha dada pela observação ao longo do tempo. Há causas uma mais remotas e outras mais recentes, é para estas que as interpretações, várias, apontam.
Para Cecília Meireles uma das causas que levou aos danos a que o partido ficou sujeito foi ter-se virado para dentro a discutir questões ideológicas em vez de discutir os problemas do país, o que, para ela, foi uma perda de tempo. Ela sendo militante do partido sabe as causas muito melhor do que eu. Todavia, olhando ao longo de algum tempo verifico que as causas podem remontar ao tempo da PaF quando o CDS fez uma coligação como PSD e acrescido pela trocas e baldrocas do líder do CDS-PP, Paulo Portas, ao revogar o irrevogável aquando da sua inesperada demissão de ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros abriu uma crise política em julho de 2013. Portas voltou atrás e ficou no Governo liderado pelo PSD como vice-primeiro-ministro.
Paulo Portas chegou ao Governo pela segunda vez após as legislativas de 5 de julho de 2011 após obter um dos melhores resultados para o CDS (11,7% e mais de 650 mil votos), que elegeu 24 deputados.
A gota de água para saída do líder do CDS do Governo foi na altura a escolha de Passos Coelho de Maria Luís Albuquerque para substituir Vítor Gaspar, que tinha apresentado a sua demissão. Paulo Portas queria um novo responsável na pasta das finanças.
Quatro dias após Paulo Portas ter apresentado ao então primeiro-ministro o seu pedido de demissão que seria “irrevogável” os líderes dos dois partidos que compunham a coligação chegaram a um acordo. Este incluía a manutenção de Portas no Governo, já não como ministro dos Negócios Estrangeiros, mas como vice-primeiro ministro. O irrevogável tornou-se não irrevogável.
A ameaça de demissão por Paulo Portas provocou um mês de crise da qual o CDS não saiu ileso do episódio e teve numas sondagens o pior resultado. Nesse mesmo mês de julho, o CDS não conseguia mais do que 8,1% das intenções de voto, resultado negativo para o partido de Paulo Portas que nunca tinha registado um número tão baixo.
Após um mês de crise, provocada pela demissão de Paulo Portas do Governo, o CDS não terá saído incólume deste episódio e recebe dos portugueses o pior resultado desde o início do barómetro das sondagens.
As eleições legislativas de 2015 não deram à coligação PaF, (PSD com CDS), uma maioria absoluta e não foi mesmo conseguida com uma maioria parlamentar de direita tendo o PS e os partidos à sua esquerda conseguido a maioria de deputados. Na sequência da moção de rejeição apresentada pelo PS ao programa de governo da PaF foi aprovada, com votos a favor de todos os deputados de PS, PCP, BE, PEV e PAN (123). E votos contra de todos os deputados do PSD e do CDS (107). Não houve abstenções.
O CDS-PP liderado por Paulo Portas tinha concorrido em coligação com o PSD às legislativas de 4 de outubro de 2015, apesar da vitória, o PSD e o CDS-PP em conjunto tinham obtido 38,55% e perderam cerca de 722 mil votos relativamente às legislativas de 2011 quando concorreram separados. A coligação ficou com 104 deputados.
Em dezembro de 2015 Paulo Portas comunicou aos dirigentes partidários da comissão política do CDS que não ia recandidatar-se à liderança no próximo congresso que seria convocado em Conselho Nacional no dia 7 de janeiro de 2016.
Em janeiro de 2016 Assunção Cristas então vice-presidente do CDS-PP anunciou que seria candidata à liderança do partido no 26.º Congresso, que iria decidir a sucessão de Paulo Portas.
Assunção Cristas no XIX Governo, entre 2011 e 2013, tinha sido Ministra da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, e entre 2013 e 2015, Ministra da Agricultura e do Mar. Assunção Cristas foi responsável pela introdução, em 2013, de uma política que facilitou a plantação de eucaliptos em Portugal, acabando com muitas das restrições existentes anteriormente relativas ao eucalipto.
Em 2012 Assunção Cristas foi mentora da Lei do Arrendamento. Como jurista sabia bem das consequências desta norma que aplicada terá causada que milhares de inquilinos serem despejados ou obrigados a abandonar as suas casas pelo excessivo aumento das rendas que alguns consideraram uma lei iníqua e cruel por colocar senhorios em total supremacia sobre os inquilinos.
Em dezembro de 2015 o líder do CDS-PP, Paulo Portas comunicou que não se recandidataria à liderança do partido. A 12 e 13 de março de 2016 realizou-se o 26º Congresso, em Gondomar, no qual Assunção Cristas assumiu a presidência do partido que tinha concorrido em lista única, tendo sido reeleita presidente do CDS-PP no 27.º Congresso a 10 e 11 de março de 2018.
Terá começado aqui no seguimento da demissão de Portas a queda do CDS que Cristas não conseguiu segurar atempadamente. Foi no entanto o início da queda do CDS já com Assunção Cristas. Paulo Portas sentiu que iria ficar agarrado ao seu “irrevogável” e terá previsto o que se iria passar com o CDS, antecipou, assim, uma saída estratégica a tempo de poder vir a ser responsabilizado pelo descalabro do partido.
Em fevereiro de 2019 Cristas apresenta uma moção de censura ao Governo e dispara contra a esquerda e contra o PSD por apoiar o PS no parlamento e vai dizendo que recebeu manifestações de apoio relativas à moção de censura que o partido apresentava ao Governo. Lembrava que foi "uma decisão tomada por unanimidade na Comissão Executiva da CDS”. Entretanto o deputado socialista Ascenso Simões sugeria que a moção de censura do CDS-PP ao Governo fora motivada pelo "fantasma" da privatização do Pavilhão Atlântico no anterior Governo (PSD-CDS), processo em que Assunção Cristas teve responsabilidades como ministra.
Nas eleições legislativas em 6 de outubro de 2019 o CDS-PP obteve um escasso resultado de 4,22%, 221.774 votos o que lhe atribuíram apenas 5 deputados comparando com 2011 quando concorreu isolado quando conseguiu 11,7% e 24 deputados, a perda foi enorme.
Confirmando esta perda, uma hora e pouco depois do fecho das urnas das eleições de outubro Cristas pediu a realização de um congresso extraordinário e disse não se iria recandidatar. Neste 28.º Congresso realizado a 26 e 27 de janeiro de 2020 Francisco Rodrigues dos Santos foi eleito para a presidência do partido.
Em outubro de 2021 durante a polémica contra o líder do CDS Rodrigues dos Santos e para a marcação dum congresso o ex-dirigente do CDS Paulo Portas afirmava que faria tudo o que pudesse para não se desfiliar do partido. Afirmou ainda que a situação era "grave" e que "o líder de um partido democrático não cancela eleições internas" referia-se a Rodrigues dos Santos.
Por razões óbvias, decorrentes do que afirmei anteriormente, a queda do CDS começou com a demissão de Paulo Portas e com Assunção Cristas a ocupar a liderança do partido. Paulo Portas terá previsto o que se iria passar e tomou a iniciativa de sair pela porta grande para não ser envolvido no desastre que antevia acontecer ao partido.
Em abril de 2019 é fundado o partido CHEGA de direita radical, populista de direita que defende o liberalismo económico, o nacionalismo português, o conservadorismo nacional, conservadorismo social, o euroceticismo, o nativismo, é anti-imigração, anti ciganismo e o antifeminismo.
O surgimento deste partido que elegeu um deputado terá também sido uma causa próxima, senão a mais importante, da perda de votos do CDS e alguns do PSD, talvez devido à fuga para o novo partido dos que se encontravam acantonados naqueles partidos dos que com ele melhor se identificariam; o mesmo terá acontecido com a volatilidade de votos, sobretudo dos eleitores associados à incerteza e à imprevisibilidade que são mais sujeitos à manipulação e à demagogia.
Tudo quanto se possa dizer para justificar o descalabro a que chegou o CDS nesta eleições não chega, há que investigar outras razões mais profundas e uma das possíveis respostas poderá estar não apenas no líder Francisco Rodrigues dos Santos, mas na volatibilidade do eleitorado para os novos partidos que entretanto surgiram e cuja linguagem fascizante atrai alguns e o IL cuja narrativa, embora clássica e ortodoxa de liberalismo que face à novidade terá atraído muitos jovens e gentes das classes mais altas que antes terão votado CDS ou PSD.