Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

A Propósito de Quase Tudo: opiniões, factos, política, sociedade, comunicação

Aqui vocês, podem encontrar de tudo um pouco: sociedade, ambiente, comunicação, crítica, crónicas, opinião, política e até gastronomia, com apoio de fontes fidedignas.

Agressividade de jornalistas e ódios de estimação

29.11.23 | Manuel_AR

Clara Ferreira Alves-2.png

O jornalismo é uma atividade que visa informar, esclarecer e fiscalizar os factos de interesse público, com base em princípios éticos e deontológicos. O jornalismo não deve ser uma competição entre gladiadores. A agressividade no jornalismo compromete a credibilidade, a imparcialidade e a responsabilidade social do jornalista. Portanto, o jornalismo deve ser praticado com respeito, diálogo e equilíbrio sem recorrer à agressividade como recurso retórico ou estratégico e sem ser através da expressividade que não tenha um propósito claro a não ser uma descarga emocional. É uma forma de alívio.

Assim, há jornalistas e jornalistas e há pessoas como a senhora Clara Ferreira Alves, escritora e jornalista(?) que é um autêntico catavento. Já a ouvimos defender uma coisa e o seu contrário. Quando esteve ainda não há muito pouco tempo a fazer umas crónicas em Israel, não como repórter de guerra, como muitos outros, mas para escrever e debitar na televisão bonitas crónicas ao bom estilo “clarense”. Ela é contundente e uma combatente agressiva, como se as palavras, as frases e os parágrafos fossem uma espada desembainhada por uma gladiadora.

A sua preocupação jornalística parece prender-se mais com escrever opiniões e crónicas que estejam a ser mais consumidas por certos setores e conforme ou contra o acordo da corrente dominante na altura e a ocasião se propicia. E fala do alto da cátedra. Depende do que estive a dar nas opiniões destinadas a certo tipo de consumidores. Desta vez a senhora jornalista(?) no que se refere ao tipo de argumentação parece ser mais aproximada da argumentativa do CHEGA e da IL este, com uma linguagem que está a aproximar-se cada vez mais do primeiro, num artigo que escreveu no jornal onde escreve está nesta linha. Artigo que, devo acrescentar, gostei de ler, mas que, a certo ponto descamba. Há ódios de estimação consoante o momento, favorável ou desfavorável para a venda da sua escrita, bem construída, muito literária por vezes plena de hostilidade e provocação pessoais e até institucionais, dependendo das pessoas ou ocasião que surja para ser o seu alvo predileto.

Não coloco em causa o direito que lhe assiste para criticar e julgar partidos e pessoas, mesmo que não esteja dentro das situações a não ser através de agentes exteriores. Refiro-me ao modo e à linguagem ofensiva em lugar da discussão de ideias e procedimentos cuja prova não se descortina e, daí, podermos considerar que seja pleno de hipotéticas verdades que estejam na sua mente. Em vez de se limitar à crítica insiste na ofensa e no descrédito de pessoas sem prova fundamentada a não ser pelo que lê, ouve e vê nos media, fontes a que também todos nós temos acesso. Narrativas demagógicas é o que há mais por aí. Algumas partes das suas narrativas colocam-se ao nível dos artigos publicados no pasquim Diabo. É neste tipo de imprensa que parte do artigo da D. Clara Alves deveria ser publicado. O que acontece é que a truncagem de apenas uma parte do seu artigo, sem o seu contexto e que interessa apenas a algumas correntes de oposição, é feita circular pelos basfond das redes sociais.

Também, no programa “Noite da Má Língua” da SIC, o seu estado é de permanente extravagância crítica, numa atitude agressiva revelada pelo fácies, divagando de ponto em ponto, misturando argumentos reveladores do seu estado de alma. A sua narrativa parece conter algo consequente de traumas psicológicos ou, então, será para continuar nas boas graças de alguns dos seus colegas jornalistas e dos patrões da SIC e do Expresso que agora também entraram campanha eleitoral.

Como dignificar os professores? Um artigo de José Matias Alves

21.11.23 | Manuel_AR

Como dignificar os professores? Como promover a escola pública?

Esta greve do Stop é insensata, tendencialmente ilegítima e só prejudica os professores e as escolas públicas.

Leio que o presidente do Stop quer passar a mensagem de que “venha quem vier para o futuro governo, os profissionais de Educação continuarão a lutar por uma escola pública e de qualidade para todos os que lá trabalham e estudam”. E por isso decreta 13 dias de greve de docentes e não docentes até ao dia 29 de novembro.

Ora, independentemente das razões e dos sentimentos que assistem aos professores, esta deliberação não pode (não deve) eleger como vítimas os alunos e respetivas famílias. Não pode continuar a promover a instabilidade, o tédio e o abandono das aprendizagens. E, ao contrário do que afirma, esta luta está a desacreditar a escola pública, a promover a procura social do ensino particular e cooperativo e a cavar o desprestígio de uma profissão que deveria ser exemplar na adoção de um código de conduta de serviço público – porque há formas alternativas de lutar, há formas alternativas de protestar, dignificando e prestigiando a profissão.

Sustento, pois, que esta ação é insensata, tendencialmente ilegítima e só prejudica os professores e as escolas públicas. E enuncio cinco argumentos:

1. É uma greve que é feita contra o futuro governo. Ora, esta visão e este propósito não podem ser mais descabidos. Sabendo da inutilidade de ação presente, adota-se a arrogância desta medida para marcar posição? Em que valores éticos se fundamenta? Não se entenderá que deve haver limites para uma luta que parece ter abandonado as linhas vermelhas e em que vale tudo?

2. É uma greve feita para promover a escola pública de qualidade para todos. Mas não se vê que este modo de agir promove a desigualdade no acesso e na frequência da educação? Não se vê que são os mais frágeis e fracos os que mais sofrem? Não se vê que isto é um contributo objetivo para desacreditar e progressivamente destruir a escola pública que está muito longe de ser pública e de qualidade para todos e para cada um? Em que mundo vivem os dirigentes do Stop?

3. É uma greve feita para dignificar os professores. Mas a dignidade e o prestígio social e profissional só se afunda com estas práticas. Porque é um atentado aos direitos basilares das crianças – o de aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e conviver. É um atentado à tranquilidade das famílias. É um motivo objetivo para perda de trabalho de um número indeterminado de famílias. A dignidade profissional constrói-se no interior da profissão, na ação de serviço ao outro, na exigente qualidade das aprendizagens que assegura (a todos os alunos, em condições muitas vezes adversas), na responsabilidade da equação dos direitos e deveres e na capacidade de prever as consequências das ações.

4. É uma greve para arregimentar o “rebanho” e o manter unido contra um inimigo que é o Ministério da Educação e o Governo. Mas não se vê a inutilidade desta ação de “terra queimada”? Saramago, no incipit de um dos seus romances, aconselhava os seus leitores: “Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara.” Será preciso elaborar outro “ensaio sobre a cegueira”?

5. E referir, enfim, o pensamento inspirador de um sociólogo de “esquerda”, Pierre Bourdieu: “Ensinar não é uma atividade como as outras. Poucas profissões serão causa de riscos tão graves como os que os maus professores fazem correr aos alunos que lhe são confiados. Poucas profissões supõem tantas virtudes, generosidade, dedicação e, acima de tudo, talvez entusiasmo e desinteresse. Só uma política inspirada pela preocupação de atrair e de promover os melhores, esses homens e mulheres de qualidade que todos os sistemas de educação sempre celebraram, poderá fazer do ofício de educar a juventude o que ele deveria ser: o primeiro de todos os ofícios.”

Precisamos de dignificar os professores e promover a escola pública. Não precisamos de agir em sentido completamente contrário.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

Uma espécie de ação concertada?

21.11.23 | Manuel_AR

 

Crise política e PGR.png

A crise política desenrolada por via de investigações efetuadas pelo Ministério Público conduziu à demissão do primeiro-ministro António Costa.  Os desenvolvimentos que se seguiram dariam para tecer teorias da conspiração. Não é este o caso, mas dá para analisar factos antecedentes e consequentes que levam a pensar que algo poderá ter estado fora da normalidade política e judiciária.  

Não irei considerar agora os aspetos ético, político e legal do processo que envolveu atores intervenientes como o chefe do Governo, o Ministério Público e a Procuradoria-Geral da República com a mobilização dos órgãos de comunicação social, aspetos sobre os quais a discussão pública pouco se tem debruçado.

Interessa desde já tornar claro que a crise política gerada não surgiu agora por mera casualidade, estaria a ser preparada e aguardava o momento oportuno para passar há comunicação social. Para evitar caso de fugas de informação antecipadas como já tem acontecido, fez-se sair a nota para a comunicação social do Gabinete de Imprensa da Procuradoria-Geral da República de 7 de novembro desse conhecimento do inquérito que estava a ser dirigido pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) que, posteriormente informou estar o caso a ser investigado por este organismo desde outubro(?).

Tendo como base antecedentes que adiante irei referir o processo para a criação de uma crise política já estava em andamento e o seu agravamento estaria a ser delineada há cerca de ano e meio pelas oposições através de várias ações em andamento vindas da direita (incluindo a extrema-direita) e as de extrema-esquerda, independentemente e cada uma delas com a sua própria estratégia e objetivos bem definidos.

Colocada desta forma poderíamos estar a delinear uma espécie de teoria da conspiração que não teria como base qualquer facto concreto que pudesse ser validado no sentido de ser relevante e ter influência significativa. Todavia, se tivermos em consideração factos anteriores a ideia não será de todo irrealista.  Com base em factos concretos e aceitáveis provenientes em notícias que circularam durante o ano de 2022 - sobretudo neste último - e após o Orçamento de Estado para o ano de 2023, aprovado em 25 de novembro de 2022, verificamos que a agitação social começou a ser desencadeada por diversos setores profissionais acelerados pelas declarações dos partidos na oposição. Tais factos, cada um per si podem levar-nos a considerar a possível existência duma espécie de urdidura no contexto do exercício de oposição ao Governo tendente a causar a sua queda precoce, já que a maioria absoluta nunca iria cair por vontade própria.

É do conhecimento geral a forte reação negativa por parte dos partidos, quer à esquerda, quer à direita do Partido Socialista devido ao rancor que lhes causou a maioria absoluta obtida nas eleições de janeiro de 2022.

As razões para a criação de instabilidade social são diferentes de partido para partido. As extremas-esquerdas, PCP e BE, não se conformaram com a enorme perdas de votos que lhes reduziu o número de deputados na Assembleia da República. O artigo de opinião do orientador político do BE  Francisco Louçã no Expresso em fevereiro de 2022 com os argumentos costumeiros é bastante elucidativo. Escrevia na altura Louçã: “Face a este histórico, apresentar esta nova maioria absoluta como uma salvação do país, o tal “cartão vermelho” à crise, e até como a antítese de um poder absoluto, será um ato de fé, um alibi bem engendrado ou mesmo uma defesa antecipada” e ainda “o PS será também a segunda vítima da sua maioria absoluta. É certo que agora festeja a sua vitória pesada contra a esquerda…”. Disse Catarina Martins, em dezembro de 2021, ainda antes das eleições, "…há poucas coisas tão parecidas com a direita do que uma maioria absoluta do PS". O BE tinha já assestado o alvo ao PS.  

Em fevereiro do mesmo ano Jerónimo de Sousa então Secretário Geral do PCP afirmava que “o PS com condições de levar mais longe o seu compromisso com a política de direita e manter a sua opção de subordinação aos grandes interesses económicos que dominam o país", à falta de melhor a cassete costumeira também tinha já assestada as suas flechas.

À direita, durante o ano de 2023, sobretudo por parte do CHEGA e da Iniciativa Liberal, cujo linguajar deste último se aproxima cada vez mais do primeiro, intensificaram-se as ações de crítica e acusações violentas feitas de forma pública. Agora surfam em conjunto a onda desta crise política que parece estar a ser demonstrado terá sido criada artificialmente. Aliás, o acordo IL com o CHEGA poderá estar a abrir uma nova crise política e colocam o Governo PSD nos Açores em risco de cair com a discussão do Orçamento dos Açores para 2024 em que IL e CHEGA não vão votar a favor e comprometem o futuro do Governo Regional do PSD.

Não era apenas o Governo nem as medidas que tomava que estavam sujeitas ao escrutínio o que, normalmente, faz parte do papel e do debate democrático da oposição. O que estava em causa era, sobretudo, a pessoa de António Costa que visavam e em quem viam uma sombra pela sua credibilidade interna e externa. Assim, havia que o descredibilizar, fosse de que forma fosse. Outro que ficou marcado pela oposição foi Mário Centeno logo que foi para o Banco de Portugal e agora voltam ao ataque, por razões pechisbeque. Há quem afirme que isto faz parte do atributo da costumeira invejazinha portuguesa.

Greves, protestos, movimentos, reivindicações vindas dos sindicatos e outros oriundos de diferentes setores, uns afetos à direita, outros afetos à esquerda tiveram palco em 2023. Tinham a finalidade de a coberto de várias contendas causadas por vários sindicatos contra o Governo e que serviam ao mesmo tempo para contestação política. Pedia-se nessa altura a demissão de ministros e até do próprio primeiro-ministro. Pedir a demissão de ministros já vinha sendo habitual no léxico dos radicais de direita, CHEGA e IL com o objetivo de desgastar o Governo e o próprio primeiro-ministro. Claramente destinavam-se, e destinam-se agora a pressionar o Governo demissionário com prejuízo dos utentes, sobretudo dos serviços de saúde.  

Alguns exemplos são os movimentos sindicais com greves e manifestações aos quais se juntavam críticas de ordens profissionais que, afinal, só prejudicam os utentes de serviços como os do SNS, escolas públicas e hospitais.

Órgãos de comunicação social procuravam e “escavavam” casos e casinhos que, de facto, existiam e deviam ser denunciados, mas que não mereciam a importância que lhes era dada. Quando não os encontravam, para criar impacto negativo na opinião pública, na hora nobre os jornais televisivos repescavam casos do passado que passavam encadeados na edição com os atuais a que davam extensa cobertura. O alvo era sempre o mesmo e para mostrem imparcialidade retiravam da arca poeirenta casos de justiça sobre outros partidos e futebol rapidamente passados dos quais maior parte já não se recordava.

Em janeiro de 2023, após cerca de um ano do Governo da maioria absoluta, os trabalhadores da saúde fizeram uma greve nacional por melhores condições de trabalho, salários e contra as horas extras excessivas exigindo também mais investimento no Sistema Nacional de Saúde. A reivindicação embora justa, acumulava com a natureza política da pressão a fazer sobre o Governo.

Num comunicado do PSD em 15 de janeiro de 2023 podia ler-se que “O PSD acompanha com muita preocupação o que se tem passado nos últimos meses nas escolas, resultante da incapacidade de o Ministério da Educação em concluir um processo negocial com a classe docente, e que resultou na manifestação de hoje. Repudiamos por completo o tom persecutório com que o Ministro da Educação se dirigiu à classe docente, procurando usar os alunos como arma de arremesso político, ao tentar colocar os encarregados de educação contra os professores.”. O que faria o PSD nestes casos quando antes acusava os governos do partido socialista de serem despesistas?

Em fevereiro os professores mobilizados por sindicatos afetos à extrema-esquerda, entre eles o radical STOP, liderado por André Pestana que terá sido do partido MAS-Movimento de Alternativa Socialista que posteriormente terá deixado este partido. Os professores saíram à rua para protestar exigindo a recuperação do tempo de serviço de seis anos, seis meses e 23 dias progressão nas carreiras que tinham sido bloqueadas no tempo do Governo PSD-CDS com Passos Coelho primeiro-ministro. O PSD cola-se aos sindicatos e apresenta proposta sobre tempo de serviço dos professores com o BE pela voz de Mariana Mortágua a salientar que "A proposta é muito justa, a posição do PSD é hipócrita porque quando poderia ter aprovado a proposta, quando havia votos na Assembleia da República para ser consequente e para aprovar a proposta, o PSD não aprovou, não o fez”.

As posições das extremas-esquerda tinham também o objetivo de pressão e de oposicionismo, estas também aplaudidas pelas direitas. A direita PSD que na altura teve a iniciativa da congelação das carreiras, cola-se subtil e oportunisticamente ao lado destas reivindicações.

Para além disso protestavam ainda contra o aumento do número de alunos por turma, pela redução do tempo de aulas e a diminuição da autonomia das escolas. Os manifestantes pediam uma educação pública, gratuita e de qualidade para todos.

Em 2 de outubro de 2023 um título do jornal Público afirma que o “PSD agarra professores e abandona a igualdade de tratamento dos funcionários públicos”. Em fevereiro deste ano, numa entrevista à SIC Notícias, o líder do PSD, Luís Montenegro, dizia que o "princípio basilar da política remuneratória da Administração Pública é que haja equidade e igualdade, pelo que “todos os funcionários públicos” que tiveram “as suas carreiras congeladas têm que ter um tratamento equitativo e igual na recuperação do tempo perdido”. Todavia, em 30 de setembro sai a notícia de que Montenegro anunciou que o partido proporá o pagamento faseado do tempo de serviço dos professores - excluindo assim os restantes funcionários públicos. Escrevia-se no Expresso: “Mas esta é a primeira vez que o líder do PSD admite a recuperação integral do tempo de serviço ainda congelado aos docentes. Em janeiro, por exemplo, o presidente do PSD admitiu mesmo não haver condições para recuperar integralmente a carreira dos professores, devido ao impacto que isso poderia ter nas contas públicas, assim como pela necessidade de encontrar um critério que se aplique de igual forma ao resto da Administração Pública”.

O PSD em outubro deste ano diz o dito por não dito para agarrar professores e abandona a igualdade de tratamento dos funcionários públicos enquanto Pedro Duarte do PSD justificava a mudança de posição dizendo que “nem tudo pode ser uma prioridade, sob pena de nada acontecer”, contudo em 2019, Hugo Soares foi contra a reposição do tempo de serviço dos professores.

Em março, os trabalhadores dos transportes públicos paralisaram as suas atividades por 24 horas, reclamando melhores salários, horários e condições de segurança. A greve afetou os serviços de metro, autocarro, comboio e barco em várias cidades, causando transtornos aos utentes.

Em maio os funcionários públicos fizeram uma greve geral por mais direitos e dignidade, denunciando o congelamento das carreiras, o aumento da precariedade e a falta de pessoal nos serviços públicos. A greve teve uma adesão de cerca de 70% e afetou vários setores como a educação, a saúde, a justiça e as finanças.

Em julho de 2022, passados cerca de seis meses da posse do Governo, a primeira moção de censura ao Governo é apresentada pelo CHEGA que foi “chumbada” no Parlamento com votos contra do PS, PCP, BE, PAN e Livre e abstenção de PSD e IL, tendo o proponente ficado isolado no voto a favor.

Passado um ano das eleições que deu uma maioria absoluta ao PS desencadearam-se movimentos e greves sindicais para pressionarem o Governo para ceder ao que não seria possível conceder. No fundo o objetivo era desgastar o Governo e aumentar a contestação social.

Depois de um ano de mandato surgiram casos com polémicas à mistura que vieram ajudar as oposições à direita e à esquerda do PS que provocaram 13 demissões de membros do Governo. Mas a dissolução do Parlamento, com que as oposições sonhavam, ainda não estava alinhada pela precaução do Presidente da República que alegava que isso só iria agravar a crise económica do país e atrasaria o cumprimento de prazos na aplicação dos fundos europeus.

Durante aquele período, a 5 de janeiro de 2023 a Assembleia da República reprovou a moção de censura ao Governo apresentada pela Iniciativa Liberal com os votos contra do PS, PCP e Livre e as abstenções do PSD, BE e PAN.

Em setembro do mesmo ano o Parlamento debateu uma moção de censura ao Governo novamente apresentada pelo CHEGA que foi a terceira que o executivo enfrentou desde o início da atual legislatura e que teria chumbo garantido. Eram os radicais de direita, com argumentos muito pouco consolidados, apenas para mostrar serviço aos seus potenciais eleitores.

O ano de 2023, pleno de peripécias para o Governo socialista e com ataques ao primeiro-ministro António Costa seriam condições suficientes para uma potencial queda e dissolução do Parlamento não fosse a maioria absoluta. Nem tão pouco as pressões indiretas sobre o Presidente da República surgiram efeito. Assim, podemos considerar que haveria de ser criada uma estratégia que surgisse efeito.

A nova estratégia aparentemente poderá ter vindo do mais do fundo dos meios conspirativos anti Governo socialista talvez com o apoio tácito por alguma parte do Ministério Público mais permeável às circunstâncias políticas. Uma hipotética trama terá vindo do após a verificação de que o trabalho iniciado por forças políticas, sindicatos, ordens profissionais e movimentos vários não estavam a resultar com a rapidez desejada e que o tempo urgia e a incriminação de responsáveis poderia ser a arma mais eficaz através de acusações mesmo que pouco fundamentadas e fiáveis. Fica a suspeição de que a Procuradoria-Geral da República poderá vir a ser uma espécie de quinto poder da República. Sobre o tema a Procuradora Geral Adjunta escreveu um artigo no jornal Público onde aborda algumas questões apreciáveis para reflexão.

Pode duvidar-se desta tese, mas não parece ser tão absurda quantio isso, porque em qualquer poder há sempre algo que se poderá investigar e encontrar no que respeita a crimes praticados por particular contra a administração em geral, mesmo por pouco que seja, mas que voa rápido por fugas de informação através da comunicação social que se encarregará de dar o impacto necessário.

É lamentável que em democracia partidos da direita como o IL, o CHEGA e até o PSD façam uma oposição centrada em denegrir pessoalmente a integridade pessoal e política de rivais partidários para chegar ao poder em vez de se centrarem na apresentação de alternativas e soluções governativas. Quando falam em ética deviam também olhar para si próprios cuja ausência os leva no confronto político a forjar justificativas a que recorrem para apresentarem ao eleitorado à falta de programa alternativo de governo demonstrando falta de ética enquanto opositores. Ou será que a ética não deve existir no confronto político?

As extremas-esquerda, as direitas e a extrema-direita também têm muito que repensar as suas estratégias porque, para atingirem os seus objetivos partidários, apoiam-se mutuamente, embora por razões diferentes, quando se trata estrategicamente do derrube de Governos.

A mais grave crise interna na “geringonça” aconteceu no final da XXI legislatura, semanas antes das eleições europeias que foram em 26 maio 2019, ainda o partido CHEGA não tinha representação parlamentar, quando o BE, PCP, PEV, PSD e CDS-PP aprovaram em sede de Comissão Parlamentar de Educação um diploma para a contabilização total do tempo de serviço dos professores na altura da liderança do PSD por Rui Rio.

Podemos recordar ainda a célebre conjugação entre a direita, a extrema-direita e a extrema-esquerda quando, em 27 de outubro, na votação na generalidade do Orçamento para 2022, o BE votou ao lado do PSD, CDS, CHEGA e Iniciativa Liberal contra a proposta do Governo. PCP e PEV juntaram-se a este conjunto de partidos e o Orçamento “chumbou”, tendo apenas o apoio do PS, as abstenções do PAN e das duas deputadas não inscritas.

Face a isto, este é o momento oportuno para refletir sobre dois pontos cruciais para a nossa democracia: a relação entre a justiça e os media e a sua contribuição para as crises políticas, para o derrube de governos e para a destruição da imagem de cidadãos, por vezes dificilmente recuperável, quando entram num rol de ódios de estimação a partidos, pessoas e instituições devido aos mais variados motivos.  

A estas condições acrescem os movimentos sociais pronunciados por sindicatos, ordens profissionais e outros movimentos ditos independentes e autointitulados sociais, organizados através de redes sociais que influenciam, mobilizam e angariam pessoas através de retóricas demagógicas, sejam eles da esquerda ou da direita, muitos deles até vindos de partidos com representação parlamentar. Há, assim, uma correspondência negativa, por vezes tóxica, entre o poder instituído e outros poderes e órgãos de comunicação social.

Em defesa dum jornalismo livre e dos profissionais que o integram, os profissionais do jornalismo apesar de, na generalidade, serem uma força corporativistas, não obstante, uma sociedade livre e democrática exige órgãos de comunicação social livres. Disso não se tem qualquer dúvida, nem sequer é questionável sua liberdade que nem sempre é respeitada

Cada vez mais faz sentido lançar novamente para o debate público o conceito, caído em desuso, que é o do “quarto poder”. Este conceito foi pela primeira vez utilizado durante a Revolução Francesa por semelhança com o de “quarto estado” como eram o clero, a nobreza e o povo correspondendo ao primeiro, segundo e terceiro estados respetivamente. Em 1821 a imprensa foi chamada pela primeira vez por Edmund Burke o “quarto estado” devido ao seu poder. O conceito deixou, entretanto, de ser utilizado, mas enfatiza a importância do jornalismo que enfatiza a sua importância para a política.

Contudo, é evidente que a política e os partidos necessitam do apoio não apenas a imprensa, mas sobretudo das televisões e dos outros meios de comunicação como os novos media associados à internet como as plataformas digitais e as redes sociais que têm sido elementos essências para se passarem mensagens e informações falsas.

Termino com uma citação dum artigo de opinião da Procuradora Geral Adjunta titulado “Como foi possível acontecer tudo aquilo a que assistimos há duas semanas?” onde escreve a certa altura: “Como se chegou até à tomada de decisões que provocaram uma monumental crise política e cujas consequências vão ainda no adro? Uma coisa é certa: ver um certo político populista de extrema-direita monopolizar a defesa da atuação do MP, dá muito que pensar! Outros haverá que resguardaram o regozijo da crise por entre dentes e aguardam a sua oportunidade num silêncio de marketing.”

Quanto á relação órgãos de comunicação com a política falarei num próximo blogue.

A emoção criada pela informação e pelas imagens que nos invadem

09.11.23 | Manuel_AR

As emoções induzidas pelas imagens televisivas, assim como pelas opiniões que lemos, e pelos comentários que ouvimos sobre a guerra contra o Hamas após o ataque surpresa em modo terrorista no dia 7 de outubro condicionam a capacidade de análise sobre o tema.

Informação e imagem.png

O problema da guerra Israel-Hamas nos noticiários passou, nestes últimos dias, para segundo ou terceiro plano devido à crise política que, entretanto, se abriu no país. Todavia, não podemos esquecer que nada se alterou lá fora. Assim, publico na mesma o artigo apesar da controvérsia que se abriu no país, felizmente não de guerra com armas, mas com palavras o que, apesar dos inconvenientes, sempre é preferível. Mas a esse lá chegarei.

As emoções induzidas pelas imagens televisivas, assim como pelas opiniões que lemos, e pelos comentários que ouvimos sobre a guerra contra o Hamas após o ataque surpresa em modo terrorista no dia 7 de outubro condicionam a capacidade de análise sobre o tema.

A evidência dos factos que nos chegam pelos vários media mostram as evidências dos acontecimentos e, por isso não vale a pena afirmar-se que todos os media do mundo ocidental de direita e capitalistas mentem descaradamente. O Hamas acelerou um processo que lhe convinha porque mantinha a expectativa e sabia qual seria a resposta de Israel.

Há quem faça afirmações sem fundamento e confirmação, difunda informações e notícias falsas sobre o que se está a passar em Gaza. Dizem ser enganadoras e dadas por jornalistas da corrente dominante comprometidos com o ocidente que vão no sentido de favorecer Israel. Este tipo de informações e notícias têm o intuito de propaganda e muitas delas são falsas produzidas por sites, por bloggers controlados por apoiantes e simpatizantes do Hamas e pelas redes sociais.

Grita-se pelo fim da agressão a Gaza e pela paz. Temos de concordar, e muito bem! Referindo-me às circunstâncias históricas, mas às atuais, quem iniciou e atiçou comportamentos para a agressão? Se há motivos para que se defendam os palestinianos em relação a Israel, a defesa do povo de Israel também deve ser aceite. Há razões para que, arrastados pela emoção, ao apoiar-se o povo palestiniano como contraponto de posições extremistas contra Israel, estarmos também, face circunstâncias que deram origem ao conflito, estar a dar-se explicitamente apoio ao Hamas. Só não vê quem não quer! Parece estar a tornar-se um lugar-comum defender o atacante em detrimento do atacado, tal como tem acontecido com a guerra na Ucrânia.

Parece haver uma confusão entre o apoio que deve ser dado ao genuíno povo palestiniano e o apoio que se está a dar ao povo palestiniano assente na atividade do Hamas. O embaixador da palestina em Lisboa que representa o Estado palestiniano não é o mesmo que o Hamas.

Dizer aos palestinianos ou aos seus representantes legais que foram eles que começaram associando-os à atividade do Hamas é um erro. Se é certo que a atividade de Israel tem sido de agressão aos palestinianos e que esta tem causas remotas, e outras mais ou menos recentes, o caso é que, de facto, o Hamas foi a causa próxima que provocou as hostilidades agressivas de Israel. É inegável. Coloca-se uma pergunta do tipo La Palice: teria Israel regido como está a regir se o Hamas não tivesse desencadeado o macabro ataque terrorista de 7 de outubro?  Seria interessante obter possíveis respostas sem se recorrer ao já tantas vezes gasto argumento histórico recorrente sobre o passado e do que Israel fez, ou não, para justificação deste tipo de ataque do Hamas.

As extremas-esquerda do ocidente alinham com os radicais palestinianos e não com o setor moderado da Palestina, que reconheceu o Estado de Israel, e que o Hamas vê como traidor e inimigo. Este grupo militar defensor do terrorismo apropria-se do povo palestiniano de toda a faixa de Gaza e toma-o como sendo “seu” apelando ao extremismo que passa pelo extermínio de todos os judeus/israelitas com os aplausos das extremas-esquerdas em todo o mundo aliados ao extremismo islâmico.

Tem de haver uma intervenção da “comunidade internacional”, (boas intenções, visto a realidade mostrar ser diferente), para evitar futuros massacres macabros e antissemitas como os de 7 de outubro de 2023. Não podemos também deixar de mencionar os massacres contrários à ordem humanitária internacional como a intervenção de Israel em Gaza para se evitar uma escalada internacional caminhar para uma solução, o que do meu ponto de visita será improvável.

Como em qualquer guerra, devido a necessidades militares, mostra-se o desprezo pela vida dos outros, a maior parte das vezes dos inocentes. Apenas neste ponto a disponibilidade para matar intencionalmente pode aparece mais evidente no terrorismo do Hamas porque não foi por acidente foi intencional. Desconhecemos se os israelitas têm a intencionalidade de ir para além das necessidades militares. Pensemos que não. Não será que o Hamas, do modo como agiu e está a agir e sem que haja qualquer ação que o pare, não servirá de estímulo ao terrorismo para continuar sem limite sem haja ninguém que o trave.

As opiniões em confronto encontram-se extremadas, de um lado a defesa de incondicional de Israel, do outro a defesa incondicional do Hamas, envolto no nevoeiro por onde mostra estar em defesa do povo palestiniano. Ambos são uma ilusão porque nos dois povos há os que não são flor que se cheire. Ambos têm responsabilidades. Talvez até a maior quota de responsabilidade possa ter vindo de Israel ao longo do tempo.

É o Hamas que iniciou o conflito e é sobre ele que deve estar o centro das atenções porque não atacou militares, atacou e massacrou civis e este procedimento não tem qualquer como sendo para a libertação do povo palestiniano. Tal como a Rússia (Putin) iniciou a invasão da Ucrânia com argumentos comprovadamente forjados, também os que se dizem ser os representantes do povo palestiniano ao cometerem aquele ato indigno abriram a Caixa de Pandora que, provavelmente, Israel há muito estava desejoso para iniciar e amplificar um conflito há muito suspenso.

A extremas-esquerdas em conjunto com as extremas-direitas de índole nazi encontraram um pretexto para o que há muito procuravam, atacar diretamente Israel com o pretexto de defesa do povo palestiniano, e, indiretamente, atacar os EUA e os seus aliados do ocidente misturando o slogan anticapitalista.

Podemos perguntar onde estavam as extremas-esquerdas quando se viram imagens da cidade de Mariupol, na Ucrânia, arrasada pelas tropas de Putin a ser transformada num monte de escombros. Como a distinguir dos bairros de Gaza arrasados pelas bombas israelitas? Dois pesos e duas medidas?

O que se está a passar na maior parte dos países aproxima-se do que se passou nos anos 30 do século passado na fase inicial da atividade do Partido Nazi da Alemanha. A perseguição aos judeus pelo partido nazi também começou de forma gradual e intensificou-se ao longo do tempo com a marginalização social dos judeus que atingiu o auge com a implementação das “Leis de Nuremberg” em 1935 que impôs uma série de restrições severas aos judeus. Acresce ainda a chamada Noite dos Cristais em 9 e 10 de novembro de 1938 quando uma onda de violência em massa contra judeus na Alemanha e na Áustria marcou o início da escalada da perseguição nazi em que quase 100 judeus foram mortos durante atos de violência que abriu a porta para o Holocausto. Estas ocorrências representam alguns dos momentos mais sombrios da história humana.

As democracias começam a ficar em perigo. A proliferação do neonazismo que embora de forma tímida, estava em curso gruda-se agora às manifestações promovidas pelas extremas-esquerdas e começa a promover a sua visibilidade apoiando e lançando slogans antissemitas. Podemos perguntar se os que agora atacam Israel serão os mesmos, ou se serão os descendentes dos que antes se colocaram contra o nazismo, o fascismo e o Holocausto dos judeus?

Segundo o The Washington Post em 2 de novembro podia ler-se: «na Universidade de Washington, em Seattle, dezenas de estudantes gritaram "Só há uma solução!". Na Cooper Union, em Manhattan, um grupo de estudantes judeus foi trancado na biblioteca enquanto manifestantes pró-Hamas batiam nas portas a gritar "globalize-se a intifada de Nova York a Gaza!". Na Universidade George Washington estudantes escreveram mensagens antissemitas na parede duma biblioteca escolar que tem o nome de  benfeitores judeus. Um professor da Universidade Cornell declarou num comício que estava "entusiasmado" com a matança do Hamas. Um professor da Universidade de Columbia chamou aos ataques do Hamas de "impressionantes" e "surpreendentes". Em Harvard, onde houve várias manifestações, um orador declarou a cerca de mil manifestantes que os autores do massacre "não eram terroristas", mas "libertadores". Noutra marcha de Harvard, estudantes pró-Hamas empurraram e assediaram fisicamente um estudante judeu - ecoando o recente assédio a um jovem refém israelense em Gaza».

O radicalismo está a surgir da sombra em que encontrava e passou a vir para descoberto estando a arrastar pessoas e jovens com formação a usar a linguagem dos movimentos populares de violência, do tipo holocausto, organizados contra grupos étnicos ou religiosos e outros. Aproveitando o motivo a sua alegada defesa do povo palestiniano manifestam este ódio absoluto a judeus, só por serem judeus.

São poucos os movimentos contra o extremismo religioso muçulmano. O radicalismo e extremismo religioso muçulmano estão há muito presentes sendo estimulados por países dominados por teocracias antidemocráticas como é, por exemplo, o Irão.

As manifestações contra o regime iraniano opressor de mulheres quando da morte de Mahsa Aminida e de outra estudante iraniana, Armita Geravand, “agredida por não usar véu islâmico” foram escassas ou inexistentes, mesmo os apoiantes incondicionais no ocidente aos palestinianos. Será por o regime de Teerão ser xiita? A maior parte grande maioria da população da Palestina (93%) é muçulmana sunita. Embora exista uma forte minoria cristã (6% da população), a liberdade religiosa, especialmente em Gaza, sob o domínio do Hamas, é limitada.

O Hamas, sendo predominantemente sunita, é uma organização política e militar que defende uma série de princípios, conforme descrito na sua Carta de Princípios de 1988 que estabelecem a destruição de Israel, a oposição à existência de um Estado de Israel, a defesa da luta armada como único meio para libertar a Palestina e rejeitam qualquer negociação com Israel. É a guerra, e não a paz, assim como a rejeição de negociação pacífica que defende quem está do lado do Hamas. Quem está desse lado defende a Sharia, a chamada Lei Islâmica, defende o controle da forma como as mulheres se vestem e impõe a segregação de género em público.

As extremas-esquerda ao defenderem com unhas-e-dentes a política palestiniana (mas qual delas?) estão, implicitamente, a defender o terrorismo praticado pelos seus braços armados do Hamas que usa a população civil como proteção para se defenderem quando atacados e para os seus atos de ataque e de terror.

Este tipo de radicalismo islâmico defendido pelo Hamas está associado ideologicamente em alguns pontos a grupos como o Estado Islâmico e a Al-Qaeda que procuram estabelecer um Estado islâmico através da jihad, a chamada “guerra santa” transformando a suas ações como “banalidade do mal” de Arendt. No entanto, é de salientar que a grande maioria dos muçulmanos em todo o mundo condena o terrorismo e a violência cometida por esses grupos radicais.

Após o conflito Israel-Hamas tem sido convocada em todo o mundo manifestações de apoio ao povo palestiniano, mas esquecendo-se que este conflito é contra o Hamas, apesar de Israel ao longo de décadas ter mostrado uma política expansionista empurrando o povo palestiniano. Mas isso é outra conversa. O que me surpreende é que esquerda que é super progressista sobre tudo quanto sejam direitos das mulheres, defesa das liberdades, apoios a LGBTI+ e todos esses movimentos não convoca manifestações nem se solidariza em defesa dos direitos humanos e das mulheres nem contra as perseguições do regime iraniano ao povo, nem contra a polícia dos costumes nesses países.

 

Não basta acreditar e partilhar é preciso verificar

03.11.23 | Manuel_AR

Faces da desinformação.png

Quando o jornalismo sensacionalista se sobrepõe à verdade e noticia narrativas como sendo a verdade dos acontecimentos e, como no caso do hospital em Gaza, toma como verídica apenas a informação de um dos lados, o Hamas, sem o confirmar nem validar com outras fontes, então está a trabalhar no sentido da propaganda e da desinformação proveniente de apenas um dos lados fazendo com que as suas narrativas vençam.

Por entre as guerras com mais visibilidade como são a da Ucrânia e a do Israel-Hamas há uma outra guerra que se desenrola fora do campo de batalha que envolve uma disputa pela mente e pela emoção das pessoas. É uma outra guerra que passa para o meio social que reage consoante o ambiente informativo.

Em tempo de guerra a desinformação surge em enxurrada e agrava-se com a contrainformação feita pelos Estados. A desinformação, algumas vezes gerada por ignorância, outras por premeditação pelas partes em confronto na tentativa de captar para as suas razões as opiniões públicas em vários países e a maior parte das vezes toma posições antagónicas.

É uma estratégia complementar à contrainformação cuja finalidade é enganar e fornecer informações falsas ou distorcidas, para confundir, desorientar ou desmoralizar. O seu objetivo é moldar a perceção pública da realidade e influenciar o decurso das operações captando a atenção do público. Associada à desinformação tem o efeito de poder ser aproveitada por cada uma das partes para levar o público a tirar ilações e interpretações consoante os seus interesses e, em tempos de conflito, tornou-se uma tendência para aproveitar mensagens provenientes de personalidades com influência. É por isso que devemos estar atentos aos riscos e à manipulação mediática que podem atingir a democracia, os direitos humanos e até a paz mundial.

Vem ao caso o discurso do Secretário-Geral António Guterres no Conselho de Segurança da ONU, a 24 de outubro, sobre a guerra entre Israel e o Hamas onde afirmou que “um tsunami de desinformação que está a alimentar a polarização e a desumanização. Devemos enfrentar as forças do antissemitismo, do fanatismo muçulmano e de todas as formas de ódio”, palavras que levaram Israel a exigir a sua demissão do cargo de secretário-geral das Nações Unidas. A partir de um discurso ou de uma opinião é sempre possível fazerem-se várias leituras consoante os pontos de vista que se pretendam evidenciar.

Os media (órgãos de comunicação social: imprensa, rádio, televisão e internet, sobretudo as redes sociais) têm um papel fundamental na difusão da informação podendo contribuir para a manipulação da opinião pública de modo a corresponder aos pontos de vista de cada uma das partes envolvidas num conflito.

A informação, quando fornecida em termos de propaganda, assenta na difusão de ideias, valores e informações com o objetivo de influenciar a opinião pública e o comportamento das populações e, frequentemente, tem a tendência para distorcer a realidade, criando falsas expectativas ou ilusões sobre o andamento ou o possível desfecho dum conflito/guerra.

Se, por um lado, numa situação de conflito bélico a comunicação social tem o dever de informar e esclarecer sobre os acontecimentos da guerra, por outro lado, também pode servir para influenciar o moral dos militares envolvidos nas operações e da população civil assim como mobilizar apoios e denunciar atrocidades e contribuir para a difamação dos inimigos. Durante a Segunda Guerra Mundial, com meios de comunicação muito mais rudimentares comparativamente aos de hoje, foi utilizada a propaganda para influência da opinião pública sobre os vários países envolvidos.

A comunicação social, sobretudo os canais de televisão, é um elemento essencial e poderoso da propaganda que possibilita influenciar e explorar os sentimentos de patriotismo, medo, ódio, esperança e até de culpa. Por outro lado, pode gerar ansiedade, pânico, ódio, preconceito e até violência contra os inimigos ou grupos minoritários dos elementos em confronto.

Assim, surge a contrainformação com a estratégia de enganar o adversário e as opiniões públicas das nações em confronto ao fornecer informações falsas ou distorcidas, para confundir, desorientar ou desmoralizar através da rádio, jornais, panfletos, cartazes, televisão e internet. As redes digitais passaram a fazer parte das operações militares nos conflitos armados podendo interromper o funcionamento de infraestruturas essenciais e serviços vitais para a população civil. Veja-se o que está a acontecer no conflito Israel-Hamas onde foram cortadas infraestruturas de água, energia e também de redes de comunicação com consequências devastadoras associadas a danos por bombardeamentos que afetam hospitais e outros serviços que deixam de funcionar total ou parcialmente para a população civil.

Os hackers são outros elementos que estão a contribuir para a desinformação. Como não são militares não agem de acordo com instruções oficiais das autoridades, mas tornam-se elementos participantes importantes na guerra moderna, a ciberguerra, e não se abstêm de cometer crimes de guerra se consideramos as "leis da guerra cibernética” criadas pela Cruz Vermelha que parece ninguém cumprir.

Não apenas em tempos de guerra, mas também quando há polarização entre estados ou grupos sociopolíticos os hackers podem apoiar voluntariamente um lado ou outro do conflito através operações nas redes digitais globais para combater o inimigo e gerar desinformação. Pode ser, por exemplo, piratear para recolher informações ou operações de sabotagem para destruir bases de dados importantes, ou ainda espalhar desinformação. Os hackers militares podem fazer tudo isto, mas obedecem a ordens, têm comando e representam uma das partes do conflito.

Para combater a manipulação através da desinformação restaria a censura aos diversos canais de informação, como parece estar a acontecer na Federação Russa, para restringir ou proibir informações e notícias consideradas perigosas, ofensivas ou subversivas para um Estado, um governo ou para a sociedade, mas isso é algo que não se pretende. A censura pode estabelecer-se por decreto e estar implícita em algumas redações de órgãos de informação onde se evitam algumas designações como, por exemplo, as que são feitas como ser o Hamas terrorista, como é o caso da BBC.

A BBC não atribui ao Hamas a designação “terrorista” o que é justificado por um artigo no site da BBC News onde o autor escreve que: “Mas isso não significa que devamos começar a dizer que a organização cujos apoiantes os levaram a cabo é uma organização terrorista, porque isso significaria que estávamos a abandonar o nosso dever de permanecer objetivos.

Ao confundir-se isenção e neutralidade com objetividade parece de algum modo estar a confundir a opinião pública para lavar a face daquela organização. O facto é que foi mesmo um ato terrorista.

O Conselho de Segurança das Nações Unidas em outubro de 2004 na resolução 1566 considerou os atos de terrorismo “como atos criminosos, nomeadamente contra civis, cometidos com o intenção de causar morte ou lesões corporais graves, ou fazer reféns, com o propósito de provocar um estado de terror no público em geral ou num grupo de pessoas ou determinadas pessoas, intimidar uma população ou obrigar um governo ou uma organização internacional praticar ou abster-se de praticar qualquer ato que constitua crimes no âmbito e conforme definidos nas convenções internacionais e protocolos relativos ao terrorismo, não são em circunstância alguma justificáveis por considerações de ordem política, filosófica, ideológica, racial, étnica, religiosa ou outros de natureza semelhante, e apela a todos os Estados para que evitem tais atos e, se não prevenidos, para garantir que tais atos sejam punidos com penas compatíveis com a sua natureza grave.

Independentemente do que o Hamas defenda o facto é que praticou um ato terrorista no dia 7 de outubro passado. Não podemos disfarçar ou esconder uma ação explícita não a nomeando ou fazendo esquecê-la. Chamar terrorismo à ação executada pelo Hamas não é perder a objetividade. Neste caso específico, como entre outros, a independência não é ser neutro porque neste caso o ser neutro é estar a favor das atrocidades cometidas.

Num conflito como é o do confronto entre Israel e da força militar do Hamas em que este último praticou um ato de terrorismo o jornalismo e a prestação da informação ao público, seja ele que media utilize, imprensa, rádio ou televisão tem a obrigação de verificar e validar as fontes e ter a precaução necessária quando não tem certezas. Quando o jornalismo sensacionalista se sobrepõe à verdade e noticia narrativas como sendo a verdade dos acontecimentos e, como no caso do hospital em Gaza, e toma como verídica apenas a informação de um dos lados, o Hamas, sem o confirmar nem validar com outras fontes, então está a trabalhar no sentido da propaganda e da desinformação proveniente de apenas um dos lados fazendo com que as suas narrativas vençam. Um órgão de comunicação que trabalhe assim estará a trabalhar pro bono para disseminar a propaganda como pretende a organização político militar Hamas, ou, como alguns lhe chamam, Movimento da Resistência Islâmica. Se for assim, a narrativa do Hamas já venceu, e isso pode ser um enorme problema para todos nós.

Combater a desinformação é um dos maiores desafios num mundo onde proliferam informações falsas que se espalham rapidamente. Para tal, deve ser incrementar o desenvolvimento crítico do pensamento em relação à informação que consumimos. Outro ponto importante é o da verificação de fontes de uma informação antes de acreditar e compartilhar. Esta verificação deve ser conferida através de se fonte confiável e se essa informação foi corroborada por fontes independentes e respeitáveis e não partilhar informações duvidosas ou sensacionalistas.

Combater a desinformação é uma responsabilidade que requer os nossos esforços e os da comunicação social.  A atenção e o cuidado preventivo no sentido de se estar vigilante e comprometido no sentido de se promoverem informações precisas e verificadas.