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A Propósito de Quase Tudo: opiniões, factos, política, sociedade, comunicação

Aqui vocês, podem encontrar de tudo um pouco: sociedade, ambiente, comunicação, crítica, crónicas, opinião, política e até gastronomia, com apoio de fontes fidedignas.

Uma espécie de carta aberta a alguém

30.03.20 | Manuel_AR

Carta aberta.png


É curioso que até nesta fase das nossas vidas alguém protesta com tudo, diz mal de tudo, parece sugerir a desobediência, a revolução já. Denuncia erros do passado e diz que tem propostas que já apresentou, mas a que ninguém liga. Elogia uns, ataca outros, aponta o dedo a mais alguns, sejam pessoas, sejam governos, partidos e tudo o mais o que escolher como alvo. Normalmente quase ninguém lhe escapa. Nem agora abrandou face aos graves perigos para a saúde em que temos todos que estar em consonãncia em relação a este combate. 


Propostas? Que propostas? A sua finalidade é dizer sempre mal de tudo e de todos, exceto apoiar greves, quaisquer que sejam, mesmo em tempos de ansiedade e perigosos para o povo, para todos, enfim.


Os seus trabalhos merecem todo o mérito académico, mas são de diagnóstico e as soluções que diz apresentar são inexequíveis na prática, mesmo a longo tempo. São considerações teóricas baseadas em dados estatísticos que, apesar de tudo têm virtude esclarecedora. Todavia, as suas propostas, se as houvesse de facto com possibilidade de concretizar, decerto seriam de âmbito marxista. Isto é, nacionalizar, estatizar, destruir, reconstruir com uma base populista. Reconstruir a partir da terra queimada com uma revolução feita segundo a sua ideologia que ainda não vislumbrei qual seja, exceto a sua admiração e obsessão pelo marxismo e quiçá pelo leninismo mais radical.


O seu trabalho em investigação tem a segurança de quem trabalha para o Estado que tem o seu salário garantido, por isso pode achar tudo o que quiser sem correr riscos.  É tão bom falar quando se tem segurança e não estamos metidos no barulho, não é?


Diz que no programa da televisão onde participa teve há dias quase um milhão de visualizações, mas quem lhe diz que foi por sua causa e pelos seus pontos de vista no diz respeito às suas propostas para vencer a crise da saúde pública devida ao novo coronavírus? Presunção e água benta não lhe faltam...


Neste momento deve estar, como eu, a escrever os seus artigos em sítio seguro, e é tão bom falar em sítio seguro onde nada nos possa atingir! Talvez gostasse, com certeza, de ser convidada para deputada ou para uma qualquer pasta ministerial, qualquer que fosse, de um qualquer partido que estivesse no governo e ainda não foi. Isso dói-lhe!


Entretanto, vai procurando alguns argumentos, os mais simplistas, o que de si nunca esperava, para defender alguns dos seus pontos de vista que faço questão de não mencionar.


Parece ser uma constante a defesa de greves de camionistas, estivadores, entre outros, apesar das suas razões, seja em que circunstâncias for, mesmo que pudessem provocar instabilidade social acrescida à ansiedade provocada pela crise e, eventualmente, bloquear a chegada de bens essenciais às populações. Isto é revolucionário para a classe trabalhadora e operária por quem tanto zela.


Diz mal de todos os governos, sejam quais forem, mas, então, qual o tipo de governo e com que base ideológica tornaria viável, na prática, as suas ditas propostas e soluções? É isso que nos falta saber!


O mal é que aproveita esta grave crise para a saúde pública e para a economia que nos atinge a todos para fazer propaganda panfletária com os seus escritos. É pena!


Desejo-lhe boa sorte para as suas teses...  revolucionárias a aplicar em tempo de grave crise para o povo como eu já afirmei anteriormente.


Textos como os seus também os escrevi sucessivamente e em abundância no tempo de Passos Coelho, tipo obsessão compulsiva. Achei eu, depois, que talvez tivesse tido a síndrome do "coelho". Com o tempo acabei por me curar dessa síndrome, mas continuo a manter tudo o escrevi nessa altura sobre ele e a sua governação.


E, já agora, para que saiba, não sou marxista nem antimarxista, considero-me numa espécie de limbo destas duas teses o que me coloca numa posição de expetador crítico das duas posições. Uma espécie de não é carne ne peixe, posição cómoda para poder dizer o que está mal, mas, também o que está bem. A teoria política marxista relativa ao Estado e ao Direito incide sobre a necessidade e a inevitabilidade da ditadura do proletariado, como forma de Estado do período de transição do capitalismo para o comunismo. Assim, a essência revolucionária do marxismo tem, no que se refere à ditadura do proletariado, a sua expressão mais saliente.


As crises, segundo Marx, são acontecimentos que fazem parte do processo de acumulação capitalista, inerentes ao mesmo. As crises têm uma função essencial, necessária para que a reprodução capitalista se alargue, restaurando as taxas de lucro, como contrapartida da desvalorização do capital. Embora as crises tornem o capitalismo mais fraco, permitem, por outro lado, a criação de oportunidades para novo investimento e novos lucros, permitindo, também, a concentração de capital em grandes empresas e grupos económicos.


Claro que as crises a que Marx se refere são de outra categoria e não me parece que seja o caso desta crise causada pela pandemia destes novo coronavírus, mas quando as nações saírem deste pesadelo as pessoas irão abanar os neoliberalismos em todo o mundo, lá isso irão, ou talvez não…

Pandemia coronavírus e o efeito terceira-pessoa

25.03.20 | Manuel_AR

O que nos leva a pensar o que acontece de mau não nos acontece a nós, mas aos outros? Não é porque pensamos que somos invencíveis, é porque gostamos de pensar que somos imunes às influências das mensagens da comunicação social de massa e de fatores adversos. É isto que a teoria do “efeito de terceira pessoa” estuda.


Epidemia_efeito terceira-pessoas1.png


Apresentação.


Estamos em fase de pandemia derivada ao COVID-19 e as medidas a tomar têm duas vertentes a primeira obviamente ligada à saúde e a outra são políticas adotadas para lidar com o problema. Esta última é a que tem mais impacto na solução para mitigação das dificuldades mais graves que hoje vão começar, não podem estar sujeitas a pressões seja de que lóbis forem por estar em causa as pessoas e o travão à propagação da epidemia. Se a coisa agrava por falta de coragem política quem deverá ser responsabilizado? Em caso de falha, e numa circunstância como esta, assumir a culpa e fazer pedidos formais de desculpa à posteriori não serve de nada nem a ninguém. Para situações drásticas impõem-se medidas drásticas.


Vemos exemplos por esse mundo fora a serem tomadas medidas que por cá se recusam ou recusava-se que fossem tomadas apontando as mais diversas justificações e cautelas, algumas até com risco de agravamento da situação.


Artigos de opinião rebelam-se contra medidas mais severas que possam vir a ser tomadas, parecendo preferir que a doença alastre sem controle em nome de ideologias que defendem, como que a dizer que isso só acontece aos outros, a nós não!


Vem isto em relação à decisão que tardou de fechar as escolas



entários ao blogue.

Porque vale a pena ler

22.03.20 | Manuel_AR

Resultado de imagem para estado de emergencia


Imagem de RTP.PT


Querem ir para um contentor?




(Clara Ferreira Alves, in Expresso, 21/03/2020)



E que esperar dos ricos, os que podem atravessar esta crise sem problemas? Que esperar da banca que salvámos e que continua a aumentar as comissões? Que esperar do absoluto silêncio desta gente? Gostava de ouvir dizer: eu vou oferecer dinheiro para a compra de material, para a investigação, para ajudar a frente de guerra. Eu tenho um plano para ajudar os outros, os que não têm plano.


Concordo com o estado de emergência. Sei que são detestáveis as medidas de suspensão das liberdade, direitos e garantias, mas esta situação é excecional, e quem nos governa e superintende não tem a unha longa do ditador nem a garra do abutre. Nem temos o excecional sistema antidemocrático, semidemocrático ou democraticamente musculado da Ásia. Não sabemos quanto tempo a pandemia vai durar, não sabemos se vai regressar uma vez controlada e não sabemos quando teremos uma vacina para nos salvar.


 

A razão para decretar o estado de emergência é simples. E não tem a ver com o facto de as pessoas estarem a desobedecer, a ignorar a distância social ou o isolamento e a quarentena. Estamos na fase positiva, otimista e humorada da crise. Trocamos palavras de encorajamento, memes e mensagens, anedotas, vídeos, notícias falsas e verdadeiras. Estamos na fase do combate. Do choque.


Tal como com o anúncio súbito de uma doença grave, esta fase passará. A última fase é a da aceitação. No meio vêm a ira, a negociação e a depressão. O isolamento prolongado de seres humanos dentro de casas e famílias acabará por provocar estragos. Vamos irritar-nos uns com os outros e com os governantes e não existe escape. Não há entretenimento, arte, futebol, desporto, convívio, conversa de bar. Não há ar livre, a contemplação do céu e do mar, o cheiro da terra e da chuva, o brilho da luz do sol e da lua. A prisão domiciliária, mesmo com saúde, testa a nossa resiliência, e as redes tecnológicas não substituem a vida. O contacto humano extremo, na família, raspa os nervos. A ansiedade também.


No rescaldo da crise do coronavírus, a ser clinicamente debelada, virá a fase da reconstrução depois da destruição planetária. Esta fase necessita de medidas estritas de comportamento. Há que evitar o caos social, a criminalidade, os aproveitadores e todos os que florescem nas ruínas e numa economia de guerra e de mercado negro. A violência da situação ainda não nos atingiu.



Percebi isto com clareza. Que a ira virá. Estou em clausura há dias, interrompida para passear e correr pelo parque, onde reparei que ninguém mantinha a distância social e os turistas se comportavam como turistas, com as selfies do costume. A esplanada regurgitava. Os jovens bebiam cerveja na relva e contavam anedotas sobre o vírus, a centímetros uns dos outros, contentes das súbitas férias. Isto irritou-me.



Em casa, fui tratar das plantas, arrancar ervas daninhas, regar a lavanda, cortar as flores mortas do inverno. O silêncio de sepulcro foi interrompido por uma viola clássica. Uma melodia de intensa beleza, que ecoava nos pátios e iluminava o dia gelado. Depois das imagens de Nápoles e Roma a cantar à varanda, pensei que a natureza humana se redime a buscar beleza onde a pode encontrar. Até ao homem do Black & Decker. Um som estrídulo veio cortar o ar como uma faca mal afiada. O tipo do bricolage. Todos conhecemos este tipo de coca-bichinhos, assombra o Leroy Merlin, o IKEA e o AKI por distração, passa os fins de semana nos arranjos, conserta coisas por desporto e invade os vizinhos e os domingos com o ruído da broca infatigável. Do prego preciso. Da serra elétrica e da ferramenta das porcas e parafusos. O homem do Black & Decker nunca descansa e por vezes completa a tarefa com um relato de futebol. A música, envergonhada, calou-se e nunca mais voltou.


Leitores, desejei bater no homem do Black & Decker. Podia ter esperado um pouco, ter-se sentado a apreciar a melodia que nos era oferecida como um prémio na prisão. Mais tarde, na mercearia do bairro, gritei com um homem que passou à frente de toda a gente, pessoas mais velhas com máscaras, e começou aos berros a fazer perguntas em cima de mim. Foi-se embora. Estou a ficar irritada.


No fim de semana passado, fui recebendo mensagens de vários médicos, alguns do Porto, outros de Lisboa, uns destacados para a frente de guerra, outros à espera de serem destacados, uns já separados das famílias, outros em contacto com médicos italianos que lhes enviavam notícias do centro do terror. E percebi que os médicos estavam nervosos e irritados. Porque não tinham proteção e ninguém tinha pensado nisso a tempo e horas, porque se estavam a infetar, porque se iriam infetar juntamente com os trabalhadores e técnicos de saúde, porque eles são os nossos soldados e se não os tratarmos bem eles vão morrer e primeiro do que nós. O que mais os irritava era o facto de as medidas serem tardias e as pessoas não acatarem as regras. Cada português que desobedece está a pôr-nos em risco de vida, somos a carne para canhão, diziam.


Os internos em estágio foram chamados, os mesmos que a senhora ministra queria pôr a trabalhar de graça, como se fossem missionários em África. A relação dos médicos com a ministra não é boa nem de confiança, é o mínimo que se pode dizer. O stresse no meio clínico era evidente, e a raiva fustigava gente que costuma manter a calma olímpica. Os do parque, entretidos nas anedotas e cervejas, nunca pensam nos outros. Nos que estão em contacto com doentes infetados e nem proteção têm. Esta falha, ou a falta de testes, ou a infeção do Hospital de Santa Maria por incúria, a infeção de tantos médicos logo no princípio são sinais de incompetência. Querem ir para um contentor?, gritava um médico.



E que esperar dos ricos, os que podem atravessar esta crise sem problemas? Que esperar da banca que salvámos e que continua a aumentar as comissões? Que esperar do absoluto silêncio desta gente? Gostava de ouvir dizer: eu vou oferecer dinheiro para a compra de material, para a investigação, para ajudar a frente de guerra. Eu tenho um plano para ajudar os outros, os que não têm plano.



Um amigo bem abastado e abastecido contou-me que amigos dele fugiram para o Brasil e os trópicos, em aviões e jatos privados. Abandonaram o barco. Eu mesma ouvi um grupo de brasileiros ricos no restaurante do topo do El Corte Inglés a beberem vinho, em cima uns dos outros, a rirem às gargalhadas e a dizerem que no dia seguinte marchavam de avião para o Brasil e “prà ilha”. Essa Europa já era. Apeteceu-me metê-los de quarentena num contentor, ao frio. Vamos ficar irritados. Se vamos.


 


 


 



 


Covid-19. Ventura é igual aos que preferem a praia ou andam nos copos no Bairro Alto

20.03.20 | Manuel_AR

Covid-19. Ventura é igual aos que preferem a praia ou andam nos copos no Bairro Alto




Opinião de Martim Silva, in Expresso Diário, 17/03/2020 



André Ventura e o Chega, na sua onda desenfreada de populismo irresponsável, decidiram afixar mais um outdoor político, desta vez destinado a criticar o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, há duas semanas em isolamento voluntário na sua casa de Cascais.


“Marcelo em quarentena. Um verdadeiro Presidente não se esconde”, lê-se na mensagem difundida por aquele partido.


A forma como se comportou Marcelo nas últimas semanas dá azo a muitas críticas e por isso mesmo este tipo de mensagem pode passar com alguma facilidade, mesmo junto daqueles que não professam qualquer simpatia por André Ventura.


O problema é que a mensagem esconde algo de bem mais grave, que decorre da ‘normalização’ da sociedade pós-verdade das redes sociais, em que a informação correta sobre os assuntos vale bastante menos que seguir uma onda de indignação fácil que apela aos nossos instintos mais primários. E em que o insulto faz parte do dia a dia.


Perante uma pandemia de proporções ainda desconhecidas, acusar alguém de se esconder quando opta pelo isolamento voluntário é do mais mesquinho que já ouvi


No fundo, o que Ventura e o Chega fazem é mais ou menos o mesmo que aqueles que, atirando às urtigas as recomendações das autoridades e responsáveis de saúde, não se coibiram de rumar aos milhares às praias mal o sol fez subir um pouco a temperatura. Ou que continuam alegremente a assobiar para o lado e a enfrascar uns copos no Bairro Alto ou outros locais de diversão noturna, ignorando os perigos para si e sobretudo para os outros.


No fundo, o que fazem é ignorar o alarme que a pandemia do Covid-19 representa para cada um de nós e para a sociedade coletivamente. É ignorar o potencial de risco de um novo vírus do qual ignoramos muito (mas que já sabemos que é muito contagioso e bastante mais mortal que a gripe comum) e acreditar que tudo não passa de uma imensa cabala ou histeria coletiva criada para nos assustar a todos.


Voltemos ao Presidente.


Claro que Marcelo devia ter explicado melhor logo desde o primeiro dia a que se devia o seu isolamento (que foi aconselhado pela ministra da Saúde).


Claro que Marcelo nunca deveria ter ido à janela dar ‘entrevistas’ sem nexo.


Claro que Marcelo devia evitar falar aos portugueses num vídeo caseiro de má qualidade em que a mensagem mal passa.


Mas, ao isolar-se, Marcelo mostrou aos portugueses como o assunto era para levar a sério.


Mas Marcelo ao falar aos jornalistas também mostrou como se deve ter todos os cuidados mas sem cair em alarmismos e acreditando que a vida continua e que a normalidade deve ser mantida… dentro da anormalidade disto tudo.


Mas Marcelo, ao seguir os passos exigidos para convocar o Conselho de Estado e decretar o estado de emergência, também mostra como, mesmo numa situação delicadíssima, a burocracia é necessária e a melhor garantia que temos contra a tirania e a arbitrariedade de quem nos governe.


Marcelo pode ter cometido erros políticos. Mas mil vezes mil os erros políticos de Marcelo do que as mensagens incentivadoras de ódio primário destes populistas que nos entraram pela janela.


Pandemia e medidas drásticas, ou não, eis a questão

17.03.20 | Manuel_AR

Coronavirus-medidas drásticas.png


Hoje pensando na desdramatização que Trump fez sobre a epidemia do coronavírus e as decisões tardias que tomou, ou melhor não tomou no seu país. Assim, inspirado num artigo de opinião de um escritor que escreve sobre questões políticas, culturais, religiosas e de segurança nacional nos EUA e autor do livro “A morte da política:como curar anossa república desgastada depois de Trump”, resolvi escrever um artigo sobre a forma como Ronald Trump tem encarado a pandemia viral do COVID-19.


Aqui no nosso retângulo para o mar virado, as medidas que se têm vindo a tomar têm sido também, de certo modo tardias, comparativamente a alguns congéneres europeus, aparentando um certo receio de tomar medidas drásticas, mas necessária,


Segundo o autor a presidência de Trump acabou e demorou muito mais do que deveria, mas os americanos já viram o vigarista por trás da cortina. Em 2016 escreveu no New York Times  num artigo com o título “Por que nunca vou votar em Donald Trump” que, apesar de ser um republicano ao longo da vida que trabalhou nas três administrações da presidência anteriores do Partido Republicano, nunca votaria em Donald Trump, embora considere que o seu governo alinhe muito mais com as opiniões políticas do autor do que se fosse uma presidência de Hillary Clinton, deixou os seus colegas de partido confusos.


Ele explica então que Trump é intelectualmente, moralmente, temperamentalmente e psicologicamente inadequado para o cargo. Essa é a consideração primordial na eleição de um presidente, em parte porque, em algum momento, é razoável esperar que um presidente enfrente uma crise inesperada e, nesse ponto, o julgamento e discernimento do presidente, o seu caráter e capacidade de liderança é o que realmente importa.


Trump mostra não estar familiarizado com a maioria dos problemas e, muito menos, dominá-los, o que ficou demostrado com o problema do coronavírus. Ele admitiu que não se prepara para debates ou estuda os dossiers informativos justificando que essas coisas atrapalham um bom desempenho. Nenhum candidato importante à presidência jamais foi tão desdenhoso quanto ao conhecimento, tão indiferente aos fatos, quanto imperturbável pela sua falta de visão.


Não queremos que isso aconteça aqui, no nosso quadrado.

Processos de difusão espacial de inovações e de surtos epidémicos

06.03.20 | Manuel_AR

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Fonte: London School of Hygiene & Tropical Medicine; COVID Tracker. 5 Março 2020


Figura 1


O Homem e a sua influência situam-se no contexto do espaço e do tempo e este facto tem uma riqueza intelectual e conceptual que faz parte de um dos mais fascinantes campos da geografia humana. Foi por isso que durante a minha licenciatura em Geografia Humana na especialidade de Planeamento Regional e Local me entusiasmei pelos estudos na área da difusão espacial.


Interessado pela evolução da recente epidemia do Coronovirus, COVID-19, que se tem difundido a partir da China fui rever alguns temas sobre esta matéria em que me debrucei para mostrar o processo e os modos pelos quais doenças epidemiológicas podem ser transmitidas. Este texto revisto e atualizado não trata especificamente da difusão de uma doença epidemiológica, o que sairia fora do âmbito do meu conhecimento, mas, sobretudo, dos processos de difusão em geral de ideias, inovações e doenças contagiantes e o modo como se disseminam no espaço geográfico.  


Bases para um estudo sobre difusão espacial.


Em Geografia Humana o termo difusão refere-se à disseminação de um lugar para outro de pessoas, bens, ideias, práticas culturais, doenças, tecnologia e outros fatores. Esse tipo de propagação é conhecido como difusão espacial. O homem, o espaço e o tempo são as áreas da difusão que se ocupa dos problemas da dinâmica espacial.


O mais notável esforço inicial para os modelos de difusão espacial pertenceu a Hägerstrand, geógrafo sueco, professor de geografia na Universidade de Lund, conhecido pelo seu trabalho nesta área. Hägerstrand desenvolveu modelos probabilísticos com técnicas estatísticas para simular como é que um processo de difusão progride ao longo do espaço e do tempo, e ilustra como a disseminação de um fenómeno geográfico pode ser representado quantitativamente. Não irei abordar o aspeto estatístico porque envolveria modelos estatísticos que caem fora do pretendido.


Quando consideramos a influência exercida pelo homem no contexto do espaço e do tempo não podemos perder de vista as interações que condicionam explicitamente, no sentido meramente estático, as suas atividades dentro das dinâmicas e dos padrões espaciais dos processos de difusão que atuam no espaço e ao longo do tempo. Os paradigmas do homem sobre o espaço geográfico através do tempo é algo fascinante de ser analisado e estudado. Mas, afinal qual é o objeto de estudo da difusão espacial?


Conceitos básicos.


Para iniciar e ao debruçarmo-nos num determinado campo de estudo precisamos de adquirir um corpo de conceitos, inicialmente simples, a partir dos quais podemos construir estruturas mais complicadas. Partimos então de princípios óbvios: primeiro, qualquer coisa no sentido lado que se mova pelo espaço geográfico é transportada ou levada de algum modo; segundo, a percentagem das coisas que se movem no espaço são influenciadas por outras coisas que a causam. Assim, quando começamos a pensar nos vários tipos de difusão espacial, devemos considerar o quê e quem se desloca, e o que é levado e, ainda, as barreiras que podem dificultar as entradas no processo de difusão. São eles os transportadores ou portadores de algo que vão desde uma ideia, uma inovação, uma migração, quaisquer que sejam, até à disseminação de uma qualquer doença epidemiológica.


Quando se pensa em transportadores o que nos vem logo à ideia é o transporte de mercadorias e o movimento de pessoas em todos os espaços geograficamente habitados e frequentados através dos diversos meios de transporte, assim como os seus movimentos, seja nos espaços das grandes metrópoles, seja nas pequenas cidades, vila, aldeias e espaços rurais.


As pessoas são suscetíveis a aceitar certas ideias e inovações e ser resistentes a outras. Uma vez que um indivíduo adere a uma ideia, ele pode, após um período de tempo mais ou menos prolongado passá-las para outras.


Como de processa então o fenómeno da difusão espacial?


Difusão_fig1a.png


Figura 1a Difusão por expansão (Adaptação a partir de Peter Gould)


 



 

André Ventura descobriu a stand-up comedy

02.03.20 | Manuel_AR

(Bárbara Reis, in Público, 28/02/2020)


Ventura JPúblico.pngA maioria dos antigos combatentes, como a maioria dos portugueses, não precisa de acção social. Ventura sabe que falar dos 370 mil ex-combatentes que recebem apoios à sua pensão não faz ninguém rir nem lhe dá votos.


No domingo, em Viseu, o deputado André Ventura divertiu uma audiência de apoiantes em registo de stand-up comedy. Fiquei espantada, ainda não tinha visto o novo estilo.


Desconheço se foi uma performance única ou se vai ser o tom da campanha para as presidenciais — este sábado, em Portalegre, Ventura oficializa a candidatura a Belém. É provável que o deputado o adopte. O estilo é eficaz: durante 50 minutos a audiência riu à gargalhada.


Olhando para a sala, os apoiantes do jantar de Viseu parecem encaixar na categoria de “politizados, cépticos e urbanos” que, segundo o cientista político Pedro Magalhães, caracteriza os eleitores que votaram no Chega em 2019 e que têm intenção de votar no futuro.


O conteúdo do “discurso” de Viseu foi 100% político e ligado à actualidade — só acha graça às piadas quem vê notícias políticas. O humor é destemido e selvagem. Quatro excertos:


— “O Parlamento é uma palhaçada tal o ano inteiro que percebemos porque é que não funciona no Carnaval: quando chega ao Carnaval é tempo de parar.”


— “No debate sobre a eutanásia, quando estava o ouvir aquele tipo dos Verdes, que ninguém sabe quem é, e ele tinha 28 minutos… eu próprio tentei pedir a eutanásia: já não dava para mais!”


— “Este é um país que… nem a Venezuela seria assim. Os bolivarianos devem ver isto na televisão e pensar: ‘Que nunca sejamos como Portugal’. No Senegal, se alguém estiver a ver televisão, deve dizer: ‘Deus nos livre um dia ser como Portugal’. No Mali, em Omã, se calhar até na Síria, devem dizer: ‘Que nos aconteça tudo, ‘estado islâmico’, terrorismo, mas nunca, por amor de Deus, ser como Portugal!”


— “Viram o Marcelo Rebelo de Sousa dizer: ‘Temos de ter cuidado com o populismo’? Não quero dar exemplos desagradáveis, mas é a mesma coisa que um pedófilo dizer: ‘Cuidado com estas redes internacionais que andam a raptar crianças’.”


No meio de risos, palmas e frases como “não podemos continuar com a mexicanização de Portugal”, Ventura fez o seu exercício favorito: encher o debate público de nuvens e ampliar a excepção de modo a parecer a regra. O prémio vai para a frase: “Não podemos ter presos a receber subvenções e ex-combatentes do Ultramar que não recebem um centavo.”


Achei curiosa a preocupação do deputado do Chega. Em Janeiro e Fevereiro, Ventura não achou prioritário participar nos debates parlamentares sobre a defesa e os antigos combatentes da guerra colonial. Esteve ausente na discussão na especialidade do Orçamento do Estado de 2020 para a Defesa Nacional (22 de Janeiro) e esteve ausente na reunião plenária de discussão da proposta de Lei do Governo para o Estatuto do Antigo Combatente e dos projectos do PSD e do BE (14 de Fevereiro). Em ambas, teria direito a falar.


Na discussão sobre o Estatuto do Antigo Combatente falaram todos os partidos e dois deputados únicos (João Cotrim Figueiredo, da Iniciativa Liberal, e Joacine Katar Moreira, ex-Livre). A única excepção foi Ventura.


No site do Parlamento, está registado que o deputado do Chega apresentou uma “falta justificada”, cujo motivo foi “trabalho político”. A sua assessora Patrícia Martins Carvalho explicou por email que o deputado “estava em viagem para os Açores”. Qual o programa oficial da viagem? “Não teve propriamente um programa oficial. Houve reuniões com vista às eleições regionais e ao estabelecimento do partido no arquipélago.” Quanto à reunião de Janeiro, está apenas registada a falta, para já não justificada, mas a assessora não prestou esclarecimentos.


O que se disse nessa reunião é inútil para os comícios de stand-up de André Ventura: foi criada uma secretaria de Estado dedicada aos antigos combatentes; foi submetida ao Parlamento uma nova proposta de Estatuto do Antigo Combatente; o orçamento da Acção Social Complementar sobe 55% (de 5,5 milhões de euros para 8,5 milhões).


Há ex-combatentes que “não recebem um centavo” como diz Ventura? É possível. A maioria dos antigos combatentes, como a maioria dos portugueses, não precisa de acção social. Nos registos do Estado, há 372 mil antigos combatentes que recebem 48,2 milhões de euros em três subsídios: Acréscimo Vitalício de Pensão (51 mil pessoas), Suplemento Especial de Pensão (320 mil) e Complemento Especial de Pensão (1772 pessoas), um total de 372.858 antigos combatentes.


Mas não teria a mínima graça dizer em Viseu que há 370 mil ex-combatentes que recebem apoios às suas pensões. Até parecia que os nossos impostos, afinal, servem para alguma coisa. Dizer isso não faz rir e não dá votos.